sábado, 28 de janeiro de 2012

Memorial da Cabanagem: um registro

Glauce Monteiro
CLA Online
17/11/2005

Memorial da Cabanagem



Sete de janeiro de 1985. Praça Pedro Teixeira, cais do porto de Belém. Dez cabos da Polícia Militar (PM) descem do navio da Marinha de Guerra com duas urnas contendo os restos mortais do padre Batista Campos e de Eduardo Angelim. No porto, mais três líderes cabanos: Antônio Vinagre, Francisco Vinagre e Felix Clemente Malcher.

Juntos os cinco líderes receberam as homenagens aos 150 anos do movimento cabano. Todas as autoridades do Pará estavam presentes. A PM, em traje de gala, fez a salva de fuzis. Os estivadores organizaram o show pirotécnico.

As urnas foram levadas pelas ruas da cidade no carro dos bombeiros enquanto os cavalarianos da PM cercavam o veículo. Com as serenes ligadas, os batedores fardados da PM iam na frente do cortejo.

O jornalista Carlos Rocque anunciou: “150 anos depois, os cabanos voltaram a invadir a Belém. Todos eles, os milhares sem nome, representados pelos cinco maiores líderes que acabaram de ser inumados”.

Com a primeira conversa entre Carlos Rocque e o governador do Pará, Jader Barbalho, em 1983, os esforços para a construção de um memorial à Cabanagem começaram.

Através de Adalberto Neno, Rocque entrou em contato com Oscar Niemeyer. Em 30 de janeiro de 1984, aconteceu, em Brasília, a reunião entre Jader e Niemeyer. Jader agradeceu a participação do arquiteto no projeto e afirmou ser uma honra para o estado do Pará abrigar uma obra desse grande arquiteto. Por sua vez, Oscar Niemeyer, disse que a honra era toda sua em participar dos festejos em homenagem aos cabanos e que , por isso, nada cobraria pelo projeto. Era a sua doação ao povo paraense.

Mas alguns problemas ainda deveriam ser resolvidos. O terreno no entroncamento, onde se planejava construir o memorial, pertencia a DNER que desejava construir três viadutos no local. Após uma pacífica negociação, o prefeito, Almir Gabriel, assinou o contrato que passava a administração do terreno à prefeitura de Belém.

Niemeyer concordou em projetar o memorial, mas “não posso dar um prazo (para a entrega do projeto). Uma inspiração pode demorar cinco dias ou cinco meses. Vocês vão ter de ter paciência”. Alguns minutos depois da afirmação, o arquiteto ligou avisando: “pode vir amanhã ver os primeiros desenhos”. A inspiração demorou apenas cinco minutos.

Em 18 de maio de 1984, Niemeyer terminou o projeto. No dia 12 de junho, a maquete foi mostrada à imprensa. O memorial “será todo em concreto, com uma inclinação acentuada apontando para um ponto sem fim, representando a história. Terá, no meio, uma ‘fratura’. Um pedaço do monumento que jaz no chão, representando a ruptura do processo revolucionário da cabanagem, a sua derrocada. Mas como a cabanagem continua viva na memória do povo paraense, o bloco continuará subindo para o infinito. Terá 15 metros de altura e 20 de comprimento. O museu-cripta que abrigaria os restos mortais de Batista Campos, Eduardo Angelim, Francisco e Antônio Vinagre e de Clemente Malcher, conterá cinco criptas e um vitral da artista plástica italiana Marianne Perretti, a mesma autora dos vitrais do Memorial a JK, em Brasília”.

Restava, então, localizar os restos mortais dos líderes cabanos que deveriam ser transportados para a cripta. Carlos Rocque, o jornlista Orly Bezerra e o fotógrafo Dirceu Fornejo foram a Barcarena atrás dos corpos de Batista Campos e Eduardo Angelim.

O padre Batista Campos fora sepultado numa pequena urna de mármore no altar-mor da Igreja de São Francisco Xavier. Angelim, na capela do engenho de Madre de Deus na Ilha de Tramboica. Os restos mortais de Eduardo Angelim foram localizados apenas quatro dias antes da cerimônia de inauguração do memorial.

Antônio Vinagre havia sido enterrado na Igreja do Rosário dos Homens Pretos da Campina; Francisco Vinagre, no Cemitério da Soledade e Clemente Malcher, no Convento do Carmo. Mas os restos desses três últimos não foram encontrados. Assim, em suas urnas estavam um pouco de terra dos lugares de sepultamento. Era “cinzas simbólicas”.

Naquele sete de janeiro, na data em que, 150 anos antes, os cabanos invadiram e tomaram Belém pela primeira vez, a história agora registra o reconhecimento da grandeza daquela revolução. Um ano depois, em 1986, foi inaugurado o museu-cripta, mas nos últimos anos ele está desativado.

Hoje, o Entroncamento está em reformas. A estrutura viária que deverá agilizar o trânsito de Belém conservará em seu centro a lembrança daqueles que fizeram história.

17/11/2005

Fonte: http://www.ilc.ufpa.br/jornal/lazerturismo/index.php?id=16

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