domingo, 18 de abril de 2021

O MONSTRO DA INDIFERENÇA


O escritor OTTO LARA REZENDE... diz  que “De tanto ver, a gente banaliza o olhar... Vê não-vendo...”. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem... Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos...É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença...”. 

Mas, muitos, mesmo olhando, nada vêem. Não estão acostumados a enxergar.

Ao olhar o nosso patrimônio histórico, a área tombada é melhor dizer,  descobriremos como, muitos dos que passam por ela, bem pouco conseguem ver. A Cidade Velha parece uma das tantas ilhas de Belém, isolada do resto do nosso meio ambiente, primeiro pelo alagado do Piri, depois pela Avenida 16 de Novembro. Podes até entrar no bairro para trabalhar, mas te limitas a ir e voltar, sem olhar o seu entorno, sejam as ruas, as calçadas, ou a cor das casas... que deveríamos salvaguardar.

Dentro desse “burgo” - ou como se fora a quadragésima ilha, que tem por limites o rio, a av. 16 de Novembro e a av. Tamandaré,- temos nossas origens, que Paulo Chaves tão bem enfeitou... E por ali parou. Não se aproximou, nem da Praça do Carmo, nem do Mercado/Porto do Sal, nem do Palacete Pinho.

Quem sabe foi impedido pelo estado das calçadas de lioz, que na rua Dr. Assis é cheia de degraus, e na rua Dr. Malcher...de entradas em garagens. Nem a primeira rua, a Siqueira Mendes mereceu atenção, daí um belo dia, esses fazedores de maquetes, inventaram de propor um Boulevard de bares que começaria na av. Presidente Vargas e acabaria na Praça do Carmo. Respeito das leis, na maquete, não se notava.

Falando de incentivo ao turismo, resolveram tirar as lojas da Cidade Velha que servem os ribeirinhos, para instalar bares... como se quem vem para a Amazonia se contentasse de ficar sentado num bar olhando nossos ônibus passarem poluindo tudo pelo Veropa. Como chegariam  esses turistas na rua Siqueira Mendes: a pé, de bicicleta ou de ônibus? A indagação é pertinente porque estacionamentos não foram previstos... nem indicações aos ribeirinhos sobre a destinação das lojas onde compram seus produtos hoje, ainda.

Numa reunião em janeiro de 2020 onde se discutiam propostas para o Plano Diretor, após insistir em defender o comercio das ruas da Cidade Velha, me foi perguntado: “mas, afinal o que vendem essas lojas?” Fiquei me perguntando: Como programar sem conhecer as especificidades da área? Por isso a Constituição e outras leis, preveem um contato com a cidadania/bairros. O Município deve promover e “estimular a participação da comunidade através de suas organizações representativas”. Se cumprida essa exigência legal, isso poderia ampliar o necessário conhecimento e a resolução de problemas das várias áreas em estudo, por quem pouco a frequenta.

Talvez a inserção do tema da Cidadania no aprendizado escolar, de forma permanente e consistente, pudesse contribuir para formar novas gerações de pessoas que incorporem ao seu cotidiano o exercício consciente de seus direitos e deveres. O mesmo deveria ser pretendido dos agentes públicos responsáveis pela aplicação, pela fiscalização das leis, e pela repressão e punição aos infratores.  

Ninguém é dono total do saber. Precisa abaixar a cabeça e olhar para a ponta do sapato próprio e dos outros também... Parece que a maioria dos milhares de pessoas que aparecem na Praça do Carmo para seguir o Auto do Círio, nem notam o que há de relevante em seu entorno, ou na rua Dr. Assis, por onde passam para ir poluir as igrejas antigas da Praça da Sé. Outras centenas de frequentadores dos estabelecimentos noturnos de diversão da rua Siqueira Mendes, que estacionavam seus automóveis sobre o anfiteatro, as calçadas, e os canteiros da Praça do Carmo, aparentemente, também nunca notaram as lojas, mesmo com suas evidentíssimas placas.

Quem acompanha curiosos, estudantes ou turistas na Cidade Velha, se limita a mostrar os trabalhos embelezadores da nossa memória (deturpada). O Palacete Pinho e o Mercado/Porto do Sal, bem raramente fazem parte do rol de prédios que merecem atenção. A casa mais antiga de Belém, fica fora de mão, assim ninguém a sinaliza aos visitantes... Nessas alturas, como ver em que situação se encontra tudo o mais da Cidade Velha, e quem sabe até despertar a consciência de ajudar quem luta solitariamente pela causa da preservação do patrimônio cultural...?

E chegou a pandemia bem no período em que a Prefeitura resolveu requalificar as quatro praças da área tombada que faziam parte do PAC das Cidades Históricas. Na véspera da inauguração da Praça do Carmo, skatistas e patinadores se apresentaram e começaram a ... estragar a alvenaria que contorna o anfiteatro. Vigilância alguma foi prevista para fazer valerem os custos dispendidos com as obras de requalificação do logradouro, e resguardar nosso patrimônio... E nenhum projetista (ou agente público) tomou ciência dessa necessidade, apesar da Civviva ter solicitado tanto.

Até o final do trabalho de requalificação, nenhum agente público responsável pela obra sabia informar se iriam colocar nas praças algum elemento para evitar que fossem usadas como estacionamento, como reivindicávamos há tempos, apoiados pelo IPHAN. Finalmente, vi a instalação dos balizadores, que nem bastaram para toda a praça, o que foi completado depois da inauguração..., sempre sem vigilância.

Em menos de três meses notei que desaparecerem vários balizadores, inclusive aqueles na Praça do Relógio e todas as lâmpadas do entorno do anfiteatro da Praça do Carmo... O abandono das praças era evidente, inclusive pelas lampadas acesas durante o dia inteiro, e os furtos continuaram. Avisamos os orgãos competentes, e nada vimos acontecer.

Para a administração pública, o patrimônio histórico é uma herança maldita. As novas propostas de intervenções gentrificadoras, até então divulgadas, parecem ignorar os maiores riscos de aumentar a destruição. Não apenas circulando a pé, mas também de carro. Sem um processo legítimo de consulta da sociedade civil, querem reinventar uma Cidade Velha, ignorando a defesa da nossa memória e incrementando atividades que implicariam em maior trânsito de veículos automotores, e consequente maior desgaste da infraestrutura urbana local e do entorno.

Nessa defesa opaca e traiçoeira da Cidade Velha, talvez, os únicos beneficiados em tais intervenções, ao invés da coletividade,  sejam aqueles que aproveitam para explorar o consumo, muitas vezes irregular, de bebidas alcoólicas até nas calçadas em frente de casas de família, quando é dia de ...visita.

Nenhum dos responsáveis pela regulação das atividades na área tombada aparenta se preocupar com o trânsito das carretas e outros veículos de grande porte que passam desde as 6h até à meia-noite pelas vias da Cidade Velha. Por onde transitariam as carretas que abasteceriam de mercadorias os novos estabelecimentos previstos para instalação na orla do entorno da área tombada?

O interesse de construir edifícios na orla aumenta... e no meio tempo, tem sido permitido, abusivamente, o desrespeito das normas vigentes... E as minhas reclamações, vivendo nesta área tombada e percebendo os abusos, são bem diferentes de outros interesses... daí, quem defende essas ações irregulares, ou seu DAS, aproveita e me chama, no mínimo, de maledicente.

A poluição sonora, tão prejudicial ao patrimônio público e privado, e aos seres vivos, tem sido totalmente ignorada, quando permitem que o Auto do Círio supere  os 50/55 decibéis previstos nas normas nacionais para a Cidade Velha... E do mesmo modo abusivo ocorrem diversas manifestações de órgãos públicos, em frente a museus e afins na área tombada. Alguem parou na frente da ALEPA para medir os decibeis dos trios elétricos quando tem alguma manifestação?

    Na nossa opinião o Carnaval na Cidade Velha, para ser coerente com seu tombamento, deveria ser  feito com blocos de mascarados e uma bandinha. Estando em área tombada e para salvaguardar   nossa memoria carnavalesca, deveria provocar, inclusive, o minimo possivel de poluição sonora. Deveriam ser incentivados aqueles blocos que já faziam o carnaval ali, no respeito da tradição. Carnaval com  trios elétricos deveriam ser autorizados fora da área tombada..;em vez o que vimos acontecer em 2013 e nos anos seguintes? ? ?

Assim seguem as supostas ações de planejamento e de controle nos usos do território urbano. Ontem vi um operário consertando os danos causados por desportistas incivis na recém requalificada Praça do Carmo. E eu, a ‘inxirida” da Cidade Velha, até ajudou a recolocar um dos balizadores salvo de um furto..., mas vigilância na praça, não vi ainda. E então, os danos continuarão. Quem os paga?

Existem praças com suas particularidades na  área tombada. Os agentes públicos denotam desconhecer até que horas, crianças de menor idade permanecem na Praça do Carmo, por exemplo. Assim sendo, nem o Conselho Tutelar  providencia regulares rondas para cuidar desses  futuros cidadãos.

As cameras do CIOP, exitentes em dois cantos da Siqueira Mendes, na praça do Carmo, para que servem? Alguma vez foram utilizadas para ajudar a defender nosso patrimônio ou os bens públicosSerá que ninguem sabe da existência desses aparelhos?

Para planejar e controlar/fiscalizar, além das leis, há que conhecer os problemas locais dos vários segmentos, evitando-se decisões baseadas em perspectivas superficiais, de quem “vê não-vendo”, situação essa que tende a levar ao fracasso certas intervenções... A nossa Constituição prevê um modo para evitar isso.

    O monstro da indiferença não se instala em mim. Vejo, olho, enxergo.... e falo. 

    Tem gente que não gosta disso: me preferiria, conivente.


        Dulce Rosa de Bacelar Rocque - cidadã


sexta-feira, 9 de abril de 2021

DENUNCIA SOBRE... ARRANHÕES NO PATRIMÔNIO

 

Parece uma herança maldita...

Voltamos pela enesima vez a falar de DEFESA DO NOSSO PATRIMÔNIO HISTÓRICO... demonstrando a situação de duas das quatro praças requalificadas durante a última administração da Prefeitura e entregues a cidadania nos últimos meses de 2020. 

As quatro praças em questão se encontram em área tombada e estavam inseridas no PAC-Cidades Históricas, três das quais na Cidade Velha. Em 2015 já tinham sido entregues pela Secretaria Municipal de Urbanismo-SEURB a Caixa Econômica Federal todos os 04 (quatro) projetos das praças assim qualificados:

-Requalificação da Praça Dom Pedro II  (R$ 1.600.000,00)

-Requalificação da Praça do Relógio      (R$    350.000,00)

-Requalificação da Praça do Carmo        (R$    585.000,00)

 

Em fevereiro de 2016 o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN nos tinha informado quais projetos já tinham sido saldados pela Prefeitura:

 -Praça do Carmo, pago dia 23/12/2015                                          R$ 189.826,81

 -Praça do Relógio, pago dia 05/01/2016                                         R$   83.318,89

 -Praça D. Pedro II, pago dia 29/02/2016                                        R$ 501.305,32

 

Até fevereiro de 2020, não tivemos mais notícias, quando finalmente vimos que começaram a instalar uns tapumes em todas quatro. Sobre a especificação dos itens da obra, nada foi informado. Nenhum reunião foi feita ou informação foi dada as associações de bairro, como sugerem as leis em vigor. E o aumento dos custos vimos através das placas subsequentemente instaladas. 

   -Requalificação da Praça Dom Pedro II  (R$ 1.588.392,86)

    -Requalificação da Praça do Relógio      (R$   409.755,37)    

 

-Requalificação da Praça do Carmo       (R$ 1.364.588,43)  

Na ocasião, supomos que essa majoração nas despesas era consequência da nossa luta para convencer a Prefeitura a colocar impedimento nas calçadas, a fim de evitar o estacionamento irregular de veículos automotores sobre as calçadas do logradouro, prática muito corriqueira em Belém, mormente nas vias do Centro Histórico.



É oportuno notar que em  tais placas nem as informações pevistas no art. 16 da Lei nº 5.194, de 24.12.1966, foram colocadas...  De fato  todos os seus aspectos técnicos e artísticos, assim como os nomes dos responsáveis pela execução dos trabalhos não eram visiveis
 e legíveis pelo público, nas placas expostas.                     





Simultaneamente com o início dos trabalhos começaram os furtos. As placas metálicas usadas no tapume instalado para o isolamento das praças começaram a desaparecer, primeiro na Praça do Relógio. A Prefeitura as recolocava, mas no dia seguinte já tinham sido levadas novamente, até que decidiram  usar material usado, reciclando-os.

   

 



Antes mesmo da inauguração da Praça do Carmo, skatistas e patinadores começaram a usá-la e a destruir a parte da alvenaria no entorno do anfiteatro. Depois da inauguração, esses desportistas chegavam em grupos e faziam concorrência com os jogadores de futebol. Usos esses não previstos para praças, muito menos aquelas tombadas, mas  ninguém se preocupou nem com uma vigilncia nem... educar esses "cidadãos incivis".






















Não estamos falando de  "arranhões" no nosso patrimônio. Os danos são muito maiores e causados, principalmente, porque nenhuma das praças foi guarnecida com qualquer tipo, sério,  de vigilância. Assim, logo começaram a desaparecer: ... primeiro as lâmpadas (mais de vinte) do anfiteatro da praça do Carmo, e logo a seguir seis balizadores de ferro.  As lampadas que sobraram no anfiteatro, passam o dia inteiro acesas, provocando despesas inuteis; as outras , dos canteiros não dão mais luz...


















Enquanto isso, na Praça do Relógio praticamente todos os balizadores estavam sendo subtraídos, alguns derrubados pelos caminhões, outros sendo roubados. Logicamente, os meliantes ficaram à vontade para praticar o furto, porquanto, as praças não eram vigiadas, nem mesmo  pela Guarda Municipal de Belém.







 







Somente nas duas praças mencionadas foram gastos cerca de dois milhões de reais. A despeito das nossas denúncias, entretanto, nenhuma providência com relação à vigilância das mesmas foi adotada, apesar de todos os exemplos de depredações e furtos já havidos. As imagens registradas pelas câmeras do CIOP existentes na Praça do Carmo, aparentemente não foram verificadas para possível identificação dos criminosos que perpetraram o furto dos equipamentos públicos; o que seria uma forma de tentar recuperar o prejuízo, no intuito de resguardar o patrimônio cultural, o que é da responsabilidade do poder público.

 

Segundo a Lei Municipal nº 8.769, de 27.09.2010, que altera a Lei Municipal nº 7.346, de 14 de outubro de 1986; a Guarda Municipal de Belém tem como suas atribuições “...proteger sua população, guarda e proteção dos parques, praças, jardins e demais logradouros públicos ou próprios municipais, localizados em área territorial do Município...”. Não vemos isso acontecer, porém.

Não podemos continuar olhando para esses casos, apenas como um indicador da situação grave de fragmentação social... Nada justifica os danos, senão a desatenção aos fatos,  e eles precisam ser reprimidos, evitados e ...corrigidos! Sabemos que o problema do vandalismo, tem múltiplas causas, mas talvez pudesse ser minimizado, se o poder público (União, estado e município) cumprisse suas atribuições dispostas em lei, inclusive quanto ao fornecimento de educação patrimonial e de educação ambiental, de forma efetiva, à população em geral.  



   SÃO NECESSARIAS PROVIDÊNCIAS COERENTES COM OS FATOS  

                           QUE ESTÃO ACONTECENDO 

 

P.S.  FOTOS DE ADVALDO LIMA E CELSO ABREU