segunda-feira, 24 de maio de 2021

MANIFESTAÇÃO DO MPE SOBRE VETO DO VEREADOR

 

Para oportuno conhecimento enviamos a manifestação do MPE, sobre a orla de Belém ameaçada por projeto de lei do vereador Mauro Freitas, melhor qualificado abaixo.

Promotoria de Justiça de Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo de Belém 

                                                                                                        Belém, 24 de maio de 2021 

A Sua Excelência o 

Senhor Vereador ZECA PIRÃO (José Wilson Costa Araujo)

 Presidente da Câmara Municipal de Belém 

Travessa Curuzu, 1755, Marco

Assunto: votação de proposição legislativa inconstitucional com potencial de causar danos ambientais urbanísticos de grande impacto no Município de Belém.

Excelentíssimo Senhor Presidente, 

Cumprimentando-o, vimos manifestar a Vossa Excelência e as Excelentíssimas Senhoras Vereadoras e Excelentíssimos Senhores Vereadores a preocupação do Ministério Público do Estado do Pará acerca da eventual derrubada do veto do Poder Executivo Municipal ao Projeto de Lei Complementar 01, de 21 de outubro de 2020, apresentado pelo Vereador Mauro Freitas, que dispõe sobre matéria ambiental urbanística e declara ter como escopo alterar dispositivos da Lei Complementar no 02, de 19 de julho de 1999, que “Dispõe sobre o parcelamento, ocupação e uso do solo urbano no Município de Belém – LCCU, e dá outras providencias".

Tomamos conhecimento, por meio de notícias publicadas pela mídia local e também pela informação recebida dos vereadores Fernando Carneiro, Bia Caminha e Lívia Duarte, que, em reunião realizada na quinta-feira (13 de maio de 2021), o Colégio de Líderes dessa Casa Legislativa, teria decidido encaminhar, para a votação do Plenário, o veto do Exmo. Sr. Prefeito de Belém ao indigitado projeto. A intenção, segundo pautado na imprensa e na mídia local, seria de orientar o Plenário a derrubar o veto ao Projeto de Lei. 

Naturalmente, nada temos a opor ou objetar quanto à tramitação regular do processo legislativo que inclui a avaliação e votação dessa decisão pelo E. Plenário. No entanto, nos dirigimos a V.Exas. para alertar sobre os vícios de natureza jurídica que esse processo legislativo e o conteúdo desse projeto apresentam, aí sim, para os quais apresentamos as objeções.

Do conteúdo da Proposta: O referido PLC acima mencionado propõe, em seu artigo 1o , a alteração do Inciso V, do § 1o , do artigo 98 da LCCU, de forma a incluir exceção à proibição de parcelamento do solo em Zonas de Preservação Ambiental e em Zonas de Interesse Urbano Especial, para áreas e empreendimentos que já se encontram parcelados e loteados antes da vigência da Lei no 8.655/2008 – Plano Diretor de Belém. 

Essa incluída exceção busca dar legalidade a eventuais parcelamentos de solo ou loteamentos executados em desacordo com a legislação vigente à época. Cabe destacar ainda que, com a entrada em vigência da Lei no 8.655/2008 – Plano Diretor de Belém, as definições do zoneamento foram totalmente alteradas, não só em sua nomenclatura, como nas delimitações, de tal maneira que, atualmente, qualquer eventual mudança sobre a proibição de parcelamento do solo só pode ser realizada no âmbito da revisão do Plano Diretor.

Já o artigo 2o do PLC procura realizar, com muita ousadia - posto que de modo enviesado - a alteração direta de conteúdo do Anexo X da Lei no 8.655/2008 – Plano Diretor de Belém por meio da alteração do Anexo 03 da Lei Complementar de Controle Urbanístico no 02/1999 para que a Zona do Ambiente Urbano – ZAU5 admita os modelos urbanísticos M0, M8, M9, M13 e M16 sem restrições de uso, quando coincidir com a zonas de orla Setores A1, A2 e A3. No entanto, tal Art. 2º do PLC se refere a conteúdo normativo que só existe na Lei nº 8655/2008 (Plano Diretor de Belém) !!! 

A proposta do PLC é a exclusão das notas de rodapé 1, 2 e 4 do quadro que especifica a modelagem em que se aplica a projetos com uso comércio atacadista/comércio varejista e depósito. Com efeito, as notas explicativas de natureza normativa existentes no Plano Diretor e referentes a aplicação desses modelos indicados, se aplicam a Comércio Atacadista e Depósito nas Zonas de Orla. 

A nota de rodapé 1 proíbe expressamente comércio atacadista e depósito na Zona de Orla setor 1, 2 e 3, ou seja, ao longo de toda a orla sul e da orla ao longo da Av. Pedro Álvares Cabral e parte da Rod. Arthur Bernardes. A nota de rodapé 4 permite Shopping Center na Zona de Orla setor 1 (Av. Bernardo Sayão). 

A redação apresentada pelo art. 2º do PLC se utiliza de má técnica legislativa, pois gera dúvidas sobre o alcance da supressão das notas de rodapé, além de enorme insegurança jurídica, pois altera pontualmente uma parte de um conjunto que só poderia receber um tratamento adequado, em termos de clareza, lógica e segurança, no processo de revisão integral da Lei nº 8655/2008. Assim, na prática, ao mutilar a lógica tanto do quadro de modelos (anexo X) quanto do quadro de parâmetros urbanísticos (anexo XI), torna inviável a aplicação jurídica do PDM e, dessa forma, promove a paralisação do processo de decisão administrativa, seja por seus próprios operadores, seja por gerar motivos suficientes de judicialização da matéria, a cada passo.

O artigo 2o do PLC dispõe ainda sobre alteração na definição dos serviços “C”, retirando o termo genérico “transporte” e o substituindo por transportes aquaviários, logística, portuário e retroportuário, e sem também apresentar sentido e justificativa para tal, novamente, altera dispositivo do Plano Diretor, pois, originalmente, o Anexo 03 da LCCU não contempla a definição de serviços “C”, ou seja, essa definição foi incluída somente no corpo da Lei no 8.655/2008 que é o texto que realmente está sendo alterado!. 

que o PLC propõe, com certo destempero e atabalhoadamente, em resumo, poderá se constituir em ato antijurídico e violação ao processo legislativo, arriscando a reputação dessa Legislatura, pois pode configurar, em tese, violação aos Princípios da Administração Pública, conclusão a que esse Parlamento certamente deverá chegar e, por isso, repudiar com veemência e desassombro. 

Inconstitucionalidade por vício no processo legislativo

 Além dos problemas já indicados, o principal vício do indigitado processo legislativo é a sua inconstitucionalidade.

 De fato, essa proposta, da forma como foi processada, é procedimentalmente incompatível com dispositivos da Lei Orgânica do Município de Belém, da Constituição Estadual e da Constituição República pela inexistência de participação popular e de estudos técnicos sobre a matéria que trata diretamente do desenvolvimento urbano, durante o processo legislativo. Vejamos:

 Lei Orgânica do Município de Belém: 

Art. 14. A Administração Pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes do Município obedecerá aos princípios de publicidade, legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e ao preceito da participação popular no planejamento municipal e demais princípios e normas das Constituições Federal, Estadual e desta Lei. 

§ 3º. Os conselhos e órgãos colegiados instituídos nesta e em outras leis municipais se constituem em órgãos de cooperação que terão a finalidade de auxiliar a administração na análise e no planejamento de matérias de sua competência. 

Art. 115. Constarão do Plano Diretor, a apresentação de um diagnóstico aos problemas de desenvolvimento, as diretrizes para sua solução com as respectivas prioridades da administração para curto, médio e longo prazo. 

Art. 116. A política urbana a ser formulada e executada pelo Município terá como objetivo, no processo de definição de estratégias e diretrizes gerais, o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a garantia do bem-estar de sua população, respeitados os princípios constitucionais federais e estaduais e mais os seguintes: I – ordenar e controlar a utilização, ocupação e aproveitamento do solo do território do Município, no sentido de efetivar a adequada distribuição das funções e atividades nele exercidas, em consonância com a função social da propriedade; II – atender às necessidades e carências básicas da população quanto às funções de trabalho, circulação,habitação, abastecimento, saúde, educação, lazer e cultura, promovendo a melhoria da qualidade de vida; III – descongestionar o centro urbano, através de incentivo ao fortalecimento e surgimento de subcentros de comércio e de serviços; IV – integrar a ação governamental do Município com a dos Órgãos e entidades federais, estaduais e metropolitanas e, ainda, com a iniciativa particular; V – otimizar o aproveitamento dos recursos técnicos administrativos, financeiros e comunitários do Município; VI – preservar o patrimônio ambiental e valorizar o patrimônio arquitetônico, artístico, cultural e ambiental do Município, através da proteção ecológica, paisagística e cultural; VII – promover a participação comunitária no processo de planejamento de desenvolvimento urbano municipal.

 Art. 117. O Plano Diretor aprovado pela Câmara Municipal é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. Parágrafo único. Na elaboração do Plano Diretor o Município deverá considerar a totalidade de seu território em seus aspectos físicos, econômicos e sociais, incluindo necessária e expressamente: I – programa de expansão urbana; II – programa de uso do solo urbano; III – programa de dotação urbana-equipamentos urbanos e comunitários; IV – instrumentos e suporte jurídico de ação do Poder Público através de normas de representação do ambiente natural e construído; V – sistema de acompanhamento e controle; VI – diretrizes para o saneamento. 

Art. 120. O Poder Público Municipal manterá órgão técnico permanente, para conduzir a elaboração e revisão do Plano Diretor, promover a implementação e acompanhamento de suas ações, bem como, estudo de impacto de vizinhança. 1º. Na elaboração e revisão do Plano Diretor e dos Programas e projetos dele decorrentes, o Poder Público promoverá audiências públicas, seminários e outras formas de participação com a sociedade civil organizada para colher subsídio a sua efetivação na forma da lei. (...) 4º. Fica assegurada ao órgão público competente a realização de audiência pública, antes da decisão final sobre o projeto, sempre que requerida, na forma da lei, pelos moradores e associações mencionadas no parágrafo anterior. 

Art. 126. O estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano deverá assegurar: (...) II – a preservação, a proteção e a recuperação do meio ambiente natural e cultural; III – a criação de áreas de especial interesse urbanístico e de utilização pública;

Art. 133. O Município assegurará a participação das lideranças comunitárias e de outros representantes da sociedade civil organizada, legalmente constituídas, na definição do Plano Diretor e das diretrizes gerais de ocupação do território, bem como na elaboração, implementação dos planos, programas e projetos que lhe sejam concernentes.

 Constituição do Pará:

 O art. 20 da Constituição do Estado do Pará, no título que trata da Administração Pública, estatui: 

Art. 20. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos poderes do Estado e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência, publicidade e participação popular. 

Nesse caso, como fica bem claro, o sentido do termo Administração Pública aí abrange a todas as funções do Poder Público e alcança não somente o Executivo Municipal, mas também o Poder Legislativo Municipal, que deve obedecer a todos esses princípios. 

Nos títulos que expressamente tratam da matéria urbanística e ambiental: 

Art. 236. A política urbana, a ser formulada e executada pelo Estado, no que couber, e pelos Municípios, terá como objetivo, no processo de definição de estratégias e diretrizes gerais, o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a garantia do bem-estar de sua população, respeitados os princípios constitucionais e mais os seguintes: (…) 

Art. 252. A proteção e a melhoria do meio ambiente serão, prioritariamente, consideradas na definição de qualquer política, programa ou projeto, público ou privado, nas áreas do Estado. 

Art. 253. É assegurada a participação popular em todas as decisões relacionadas ao meio ambiente e o direito à informação sobre essa matéria, na forma da lei. 

Constituição da República:

 Logo nos Fundamentos da República, inscritos no primeiro artigo da Carta, se declara a expressão da soberania popular tanto na via indireta, quanto na direta: 

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Na distribuição da competência, o tratamento da matéria urbanística ficou a cargo da União: 

Art. 21. Compete à União: (...) XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos; 

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. § 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. 

A definição e detalhamento dessas diretrizes foi realizada pelo Estatuto da Cidade: Lei Federal Nº 10.257, de 10 de julho de 2001 que, no que se refere ao tema aqui tratado, assim normatiza: 

Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. (...)

§ 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão: I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade; 

Ainda sobejam outros artigos protetivos que nos reservamos apenas a fazer a referência: Artigos art. 23, III, IV e VI, 30, VIII e IX, 37, 216, V, § 1o ., art. 216-A, X, e §2º, II, art. 225, §1º, III, todos da Constituição da República. 

Assim, não há a menor dúvida de que o processo legislativo em questionamento viola frontalmente a Lei Orgânica do Município de Belém e as Constituições do Estado do Pará e da República e as normas reguladoras aplicáveis. 

Note-se, desde já, que as Cartas Constitucionais estabelecem o entendimento claro de que quaisquer projetos ou propostas de normas que tratam de matéria urbanística devem realizar o procedimento democrático da participação popular garantindo, por sua matéria, a aferição da justiça ambiental e da qualidade da decisão. 

E, de fato, para ilustrar esse entendimento, que já é integrante da inteligência jurídica da matéria estabelecida pelo Poder Judiciário, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em decisão plenária, confirmou, mais uma vez, que qualquer lei de planejamento urbano municipal – não só o plano diretor e leis de zoneamento – tem de ser precedida de estudos técnicos e participação social em sua elaboração. 

A decisão que trazemos aqui é do mês de outubro de 2019, na Ação Direta de Inconstitucionalidade – Município de Osasco, proposta pelo ativo Ministério Público Estadual de São Paulo; ADI 2101166-80.2019.8.26.0000, com a seguinte ementa, onde fizemos os destaques:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Município de Osasco. Lei Complementar nº 283, de 11 de dezembro de 2014, revogando as alíneas “a” e “b” do inciso II do artigo 75 da Lei nº 1.485, de 12 de outubro de 1978, que estabelecia “os objetivos e as diretrizes para uso e ocupação do solo urbano”; (ii) Lei Complementar nº 285, de 11 de dezembro de 2014, revogando o inciso II do artigo 21 da Lei nº 2.070, de 08 de novembro de 1988, que estabelecia “os objetivos e as diretrizes para uso e ocupação do solo urbano”; e (iii) Lei Complementar nº 315, de 10 de novembro de 2016, que “cria nova modalidade de outorga onerosa do direito de construir, altera e acrescenta incisos ao caput do art. 2º da Lei Complementar nº 171, de 16 de janeiro de 2018”. 

OFENSA ÀS DISPOSIÇÕES DO ARTIGO 180, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. Reconhecimento. Leis impugnadas que, apesar de versarem sobre planejamento e desenvolvimento urbano (art. 180, II), foram votadas e aprovadas sem que seus respectivos projetos tenham sido (previamente) submetidos a estudos técnicos e participação popular. Exigência que abrange todas as hipóteses normativas de planejamento para ocupação e uso adequado do solo, ou seja, tudo quanto diga respeito a diretrizes e regras relativas ao desenvolvimento urbano, e não apenas as questões de zoneamento. Ademais, é o próprio texto constitucional que contempla mecanismos de fiscalização, a cargo do Poder Judiciário, para extirpar do ordenamento jurídico qualquer ato (de quaisquer Poderes do Estado) que lhe sejam contrastantes, como ocorre no presente caso, daí porque afastada a hipótese de invasão de seara reservada dos membros eleitos é de ser reconhecida a alegada inconstitucionalidade por ofensa às disposições dos mencionado artigo 180, inciso II, da Constituição Paulista. Como já foi decidido por este Órgão Especial, “a participação popular na criação de leis versando sobre política urbana local não pode ser concebida como mera formalidade ritual passível de convalidação. Trata-se de instrumento democrático onde o móvel do legislador ordinário é exposto e contrastado com ideias opostas que, se não vinculam a vontade dos representantes eleitos no momento da votação, ao menos lhe expõem os interesses envolvidos e as consequências práticas advindas da aprovação ou rejeição da norma, tal como proposta” (ADIN nº 994.09.224728-0, Rel. Des. Artur Marques, j. 05/05/2010). Inconstitucionalidade manifesta. 

Ação julgada procedente, com modulação.

Conclusão:

 Assim, no dever institucional de encaminhar nossa preocupação em razão da natureza da matéria e dos vícios de inconstitucionalidade do procedimento e considerando o dever de todos os agentes políticos realizarem a fiscalização da correta aplicação do direito e da ordem jurídica, recomendo e apelo ao Plenário dessa E. Casa a manutenção do veto do Poder Executivo Municipal ao Projeto de Lei Complementar no 01, de 21 de outubro de 2020.

Em síntese, o referido PLC altera o Plano Diretor do Município de Belém sem a observância dos ditames da Lei Orgânica do Município de Belém, da Constituição do Estado do Pará e da Constituição da República, bem como ao disposto no art. 40, §4º, inc. I da Lei Federal Nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade). Com a ausência dos estudos necessários e do debate público são vislumbrados somente os riscos das propostas apresentadas. 

Como destacado nas razões do veto e também aqui nesta peça, tais propostas, se viessem a ser aprovadas, causariam problemas graves tanto para a aplicação da norma na esfera administrativa, quanto nos riscos materiais gerados. Pois, o art. 1º do PLC propõe albergar no ordenamento jurídico municipal a lógica do fato consumado com o reconhecimento da legalidade de áreas não adequadamente tratadas, legalizando o parcelamento do solo em zonas de preservação ambiental e zonas de interesse urbano municipal realizados antes da Lei 8.655/2008. Também permitiriam a utilização de espaços de orla pelo comércio varejista/comércio atacadista e depósito, alterando drasticamente e colocando em risco o patrimônio ambiental, paisagístico e urbanístico do Município de Belém, bem como causando profundos transtornos na vida dos moradores da cidade. 

Nessa perspectiva, a Câmara Municipal de Belém, no exercício da parcela do poder que o Soberano lhe conferiu, deve garantir que esse mesmo Soberano possa ter sua participação, por meio direto, no momento adequado, com intuito de qualificar e legitimar a decisão final, pelo que é necessária a manutenção do veto. 

Recordo que, além dos mecanismos de autocorreção, para corrigir vícios como ocorre no presente caso e que esse PLC manifesta de forma tão veemente, a ordem constitucional resguarda mecanismos de fiscalização e controle com legitimação de vários operadores do Direito, a exemplo do Ministério Público, no âmbito do Sistema Judiciário, para extrair do ordenamento jurídico atos originados de quaisquer dos Poderes do Estado que sejam contrastantes com a higidez necessária da ordem jurídica. 

Caso seja colocado na pauta legislativa na próxima terça-feira, dia 25 de maio de 2021, solicito a urgente e imediata distribuição, de todo modo, desta comunicação a todos os Vereadores. 

Com respeito e apreço, 

RAIMUNDO DE JESUS COELHO DE MORAES 

Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo

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