terça-feira, 14 de março de 2023

CHUVA NA CIDADE VELHA


 É TEMPO DELA, DA ‘INXIRIDA’...e quem mora em casa tem dois problemas, em qualquer bairro da cidade se encontre.

A água chega por cima e por baixo. Os bueiros entupidos ou inexistentes, ajudam os alagamentos e, de cima, a chuva aumenta as goteiras e faz o resto. Quem mora perto de um canal, tem mais problemas ainda, pois é capaz de receber o lixo ‘depositado’ ai, também.

Mesmo se estamos acostumados com chuva, o volume de água que vimos hoje é fora do normal. Com certeza os danos serão bem maiores do que aqueles provocados pela nossa chuva de todo dia. Bem cedo começaram os alagamentos e depois do almoço, la pelas 15h, chegou a maré alta...

 Hoje, a tempestade que acordou os paraenses,  fez transbordar rios e igarapés, inesperadamente,  parou sinal de transito; placas de carro eram perdidas;  os carros e motos, quase submersos.  A  ponte do Timbó, entregue sexta-feira aos cidadãos, foi completamente destruida pela força das aguas.

Agora, pensem na Cidade Velha...área tombada onde muitas casas, velhs,  estão fechadas; onde os herdeiros não sendo proprietários do bem, não tem direito a qualquer facilitação para salvaguardar o bem herdado...e tombado, para sua desgraça. Para muitos deles até o dinheiro para pagar o Iptu é um problema, imaginem consertar uma casa antiga.

Se moras nessa “herança” podes, durante a chuva, notar as goteiras que aparecem e providenciar conserto. Dai aparecem outras surpresas... As cumieiras tem hospedes: cupins e punilhas já esvaziaram essas peças e precisas muda-las... Dai descobres que as telhas que comprastes para substituir as quebradas, são mais estreitas do que as tuas, antigonas, e não servem.

Começas com a ideia de consertar uma goteira e começas a encontrar tudo o que não esperas. Que fazer? Telhas da mesma medida das tuas, não encontras mais no mercado, dai tens que ir procurar no entorno do canal da Tamandaré, telhas velhas, recuperadas de casas demolidas ou derrubadas... 

Isso tudo, com as casas habitadas. E aquelas que estão abandonadas?   Os  “pretensos” defensores do patrimônio, não tem a menor ideia desses problemas que tem os “herdeiros” , moradores ou não, e do que oferece o comercio na área tombada... Naquele entorno descobrimos também os “ferro velho” que aumentaram, na área, quando começaram a desaparecer os balizadores da praça do Carmo e entorno.

É esse desconhecimento que leva a defesa de construção de bares/danceterias na orla da Cidade Velha, esquecendo que os ribeirinhos também precisam, além de materiais e peças para seus instrumentos de trabalho na agricultura, também precisam de cimento, azulejos e telhas, sejam velhas que novas, para suas casas.

As leis dão direito a presença de cidadãos no momento de discussão de projetos e propostas para o desenvolvimento urbano municipal. O estimulo a participação da comunidade através duas organizações locais é fundamental. Irracional é trazer moradores de Icoaracy ou Reduto, por exemplo,  para falar dos problemas da Cidade Velha... quando sua vivencia é ocasional e consequentemente, superficial.

Quantas pessoas que, por exemplo, frequentando o Auto do Círio, sabem o tipo de comércio que tem na área tombada da Cidade Velha? Quantas pessoas sabem que os 50 decibeis previstos como ruídos aceitáveis na área tombada, são prejudiciais aos prédios antigos? Como permitir então que 70/90 decibeis salvaguardem nossa memória histórica?

A “gestão democrática por meio da participação da população” não quer dizer  ignorar os moradores,  herdeiros e proprietários, e substitui-los com amigos que frequentam  a Cidade Velha por ocasião de festas, inclusive as religiosas. 

Até mesmo coisas mais corriqueiras são ignoradas, como por exemplo, as sinalizações que a Semob, não as fazendo, facilita o não respeito das leis do transito... Quem vem de fora, sabe disso? Cadê as sinalizações das paradas de ônibus ou onde se pode estacionar na Cidade Velha? (aconselhamos a leitura do comentário de um leitor neste nossa nota : https://laboratoriodemocraciaurbana.blogspot.com/2023/03/blog-post.html )

Voltando a tempestade de hoje: será que o prédio 'ancorado' situado na Assis de Vasconcelos/28 de Setembro, foi ajudado pelo volume das águas e acabou de cair? Não, foi derrubado, mesmo, e com autorização da Prefeitura... e isso abre um precedente, bem perigoso. 














Engraçado saber que o volume de água variou de um bairro para outro: 80 na Campina e 70 no Curió e Pedreira.

Quando chove, as casas da Cidade Velhas, mesmo se de alvenaria, sofrem como todas  as outras, inclusive porque...antigas. Mas os problemas da área tombada não chegam na midia. 

Vários são os detalhes que escapam a visão de todos... e os problemas com a tempestade de hoje não são os únicos.

 Esperamos que esse péssimo resultado que vimos hoje, sirva de exemplo e leve , ao menos ... ao respeito das leis.


domingo, 5 de março de 2023

Modernas paisagens: circulação de artistas e obras de arte na Belém do final do século XIX e início do XX

 

Modernas paisagens: circulação de artistas e obras de arte na Belém do final do século XIX e início do XX


Centros e periferias são classificações móveis, dependem não só do referencial quanto da escala de comparação em que se coloca a discussão. A virada do século XIX para o XX, no Brasil, coincide com o momento em que as instituições e representações artísticas precisaram se renovar em virtude do ambiente federalista que se estabelecia a partir da instituição do regime republicano. Para o Império, o centro era o Rio de Janeiro. Com a República, a capital não deixa de ser centro, mas com a federalização, essa noção torna-se cada vez mais uma discussão e uma construção que irá se travar ao longo de algumas décadas.

E em um país que havia se descentralizado política e economicamente, novos centros artísticos também surgiram, com mais ou menos destaque na história da arte nacional. Não todos ao mesmo tempo, naturalmente. O Pará foi um deles, mas também São Paulo, Pernambuco…

O país estava se modernizando enquanto regime político; em suas formas de pensamento e anseios; em seus meios de comunicação e transporte; em seus gostos e valores; na ciência; na indústria; nas artes e suas práticas. Havia, ainda, uma demanda pela construção de identidades regionais, bem como para registrar todo esse crescimento e modernizações pelo qual as cidades estavam passando. Acompanhando esse processo, a narrativa visual era imprescindível para evidenciar esses novos protagonismos e, nesse contexto, vemos vários artistas, consagrados ou iniciantes, investindo em viagens pelas diferentes regiões do país para comercializar suas obras.

Belém, como capital em processo de modernização e onde circulava muito dinheiro advindo da economia da borracha e do que ela gerou tangencialmente, torna-se um importante mercado de arte e com uma cena artística agitada. Nomes importantes da arte nacional passaram por Belém para expor e artistas paraenses também tiveram suas obras colocadas em trânsito. Um movimento que se reflete muito claramente nas coleções de arte de museus como o MABE (Museu de Arte de Belém) e o MEP (Museu do Estado do Pará), que tem a origem de suas coleções nas compras públicas realizadas a partir de finais do século XIX para ornamentar os prédios públicos da capital paraense.

Montar coleções públicas, promover eventos de arte, bem como o ensino artístico faziam parte desse processo de modernização. Homens de política modernos (sim, pois a política, naquele momento, só era feita por homens, brancos e com posição social), que pensavam e geriam essa modernização também tinham suas atenções voltadas para o papel da arte na educação de um povo que se modernizava, civilizava (termo caro ao período) e, ao mesmo tempo, aburguesava.

O sentido era educar o olhar e pelo olhar, civilizar através da arte, do belo. Os locais para exibição e mesmo comercialização da arte estavam, também, se firmando, se impondo nessa dinâmica de cidade que se construía. A República trouxe um novo impulso; novas ideias, novas instituições, e, com isso, vemos as exposições de arte se legitimando e o colecionamento da arte se expandindo nesse momento de transformação.

Podemos ver um exemplo do que venho falando em uma galeria de retratos de pintores formada em 1908 por Remigio de Bellido, então diretor da Biblioteca e Arquivo Público (hoje, Arquivo Público do Estado do Pará — APEP). Essa galeria era exibida no salão da própria biblioteca (que já era na Travessa Campos Sales, onde se encontra o arquivo) e, por mais que fosse pública, que de fato o era, foi montada exclusivamente por doações, geralmente dos próprios artistas, tanto que muitos são autorretratos. Ao governo cabia apenas arcar com as molduras das telas. Isso dava oportunidade para que não apenas pintores paraenses participassem da mostra, mas, também, aqueles que estavam de passagem pela cidade.

Cito alguns nomes que entraram para a galeria: Pedro Campofiorito, nascido em Roma, radicado no Brasil e que viveu e lecionou em Belém por alguns anos; Oscar Pereira da Silva, nascido no interior do Rio de Janeiro, se estabelece em São Paulo e esteve expondo em Belém; Felix Acevedo, pintor venezuelano que expôs em Belém em 1909; Augusto Barradas, pintor português que esteve em Belém em meados do século XIX; e artistas que viviam e atuavam na cidade, como José Girard e Francisco Estrada.

Hoje, essa coleção faz parte do acervo do MEP e ainda sonho vê-la exposta em sua totalidade…

Assim, por essas coleções temos parte do legado de um tempo e sua visão de mundo, além de podermos identificar as marcas do trânsito de artistas citado aqui. Pinturas de nomes renomados e que expuseram em Belém, por vezes, mais de uma vez, como Aurélio de Figueiredo (de Areia-PB), Antônio Parreiras (de Niterói-RJ), Benedicto Calixto (de Itanhaém-SP), e Theodoro Braga (Belém-PA, mas que morou, estudou e atuou em Pernambuco, Rio de Janeiro, Paris e São Paulo, onde veio a falecer) figuram nos acervos e exposições desses museus, apresentando as marcas dessa circulação e os registros dessa modernidade, posto que alguns deles foram pagos para registrar as mudanças pelas quais a cidade passava.

Esses acervos guardam as imagens dessa Belém moderna que a nossa Belém antiga gerou; guardam as imagens que traduzem o que era ser moderno no início do século XX e que proporcionou tantas questões e questionamentos paras as décadas seguintes. Algumas marcas dessa modernidade são vistas em quadros como o de Antônio Parreiras, encomendado pelo então intendente Antônio Lemos, no qual o calçamento urbano e o poste estão em primeiro plano (com destaque para a iluminação elétrica); ou pelo tema da estação de captação de água pintado por Theodoro Braga. Outras estão no cerne da própria coleção, nos ideais e conceitos de sua origem. Cabe a nós apurarmos o olhar sobre elas. Que tal uma visita aos museus onde essas coleções estão preservadas?

SOBRE A AUTORA

Moema Alves é pesquisadora no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. É doutora em História.


quarta-feira, 1 de março de 2023

SUGESTÕES... COM POESIA.


Ontem assistimos  o primeiro DIALOGO SOBRE PATRIMÔNIO com o  novo presidente do Iphan, Leandro Grass. Cerca de dez pessoas do público,  aliás  numerosissimo, tiveram direito a palavrra, Pena que em dois minutos, bem pouco se pode dizer.

Nós, iludidos, levamos uma relação sobre os problemas que temos com o patrimonio na Cidade Velha. Mal apenas acenamos dois deles e entregamos ao presidente os outros para ler...  Falamos  sobre:

- a existencia de herdeiros, que, não sendo proprietários a nada tem direito e

- a poluição sonora, fazendo rir o publico com os fogos que as noivas soltam em frente a igrejas tombadas, quando acaba a ceremonia do casamento.

Não deu nem tempo de usar o termo "trepidação" para justificar nossa luta contra a poluição,  assim muitos sairam pensando que defendiamos o nosso sono, apenas, e não as contruções trepidantes.

Aproveitamos agora para dizer algo mais que não tivemos tempo de  dizer ontem

Há alguns anos, insistimos na necessidade de modificar o currículo escolar, acrescentando “educação ambiental, patrimonial e do transito”.  Desse modo a formação do cidadão seria mais completa e, possivelmente, a cura da cidade seria mais respeitosa...

Tocamos nesse argumento pela primeira vez em setembro de  2011 quando publicamos, aqui neste blog, esta nota  "DE QUE MODO O CIDADÃO PODE CONTRIBUIR PARA A PRESERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL ?"

Tivemos um comentário a respeito, com sugestões que reproduzimos abaixo. A autora inclui uma poesia sobre a obra de Landi, que agradecemos e sugerimos a leitura, novamente.

           PATRICIA VENTURA, a nossa leitora  escreveu:

Sabemos dessa verdade, mas o povo paraense padece com profundas crateras na educação, o ideal seria trabalhar a educação ambiental na educação de base formal e não formal, quem sabe, nas escolas, através das artes, literatura, talvez, com poesias que ressaltem o valor histórico dos logradouros da cidade e suas belezas, numa tentativa de proteção e preservação dos mesmo para o fomento da atividade turística...

27 de setembro de 2011 às 13:23

PATRICIA VENTURA   e sua homenagem a...

ANTÔNIO JOSÉ LANDI

Da Bolonha para o Brasil,
Veio para a Expedição,
Arquiteto e desenhador hábil,
Contribuir na fundação.

Suas obras se misturam,
Entre o Barroco e o Neoclássico,
Em Belém ainda perduram,
Fazendo a história do espaço.

Como obras memoráveis,
São João, Mercês e Sé,
Patrimônios formidáveis,
Que enriquecem a fé.

Se o projeto realizou,
A então Belém portuguesa,
Correndo aprovou,
Conferindo singela beleza.

Sendo sempre interrompidas,
As obras da Catedral,
O Landi tomou a partida,
E logo chegou ao final.

Na Belém Barroca,
O Landi fez a história,
Toda gratidão é pouca,
A quem nos deu memória.

Muito foi abandonado,
Ficando as obras ao descaso,
O pensamento tem mudado,
Por conta de um turismo ao acaso.

Ressentida pelo abandono,
Está a Igreja do Carmo,
E como ela a Capela Pombo,
E como fica o Tombo no caso?

Da cúpula octogonal,
De o frontão triangular,
O pináculo piramidal,
Que vieram para ficar.

E na história com tantas riquezas
O que resta é agradecer,
Ao homem que nos deu as belezas,
Que hoje podemos ver.


(Autor: Patrícia Ventura).
Livro: Frases, Versos e Poesias...Um brinde à vida. À venda na livraria Rosa dos Ventos ao lado da Panf. Hollywood na Almirante Barroso.

27 de setembro de 2011