segunda-feira, 24 de maio de 2021

MANIFESTAÇÃO DO MPE SOBRE VETO DO VEREADOR

 

Para oportuno conhecimento enviamos a manifestação do MPE, sobre a orla de Belém ameaçada por projeto de lei do vereador Mauro Freitas, melhor qualificado abaixo.

Promotoria de Justiça de Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo de Belém 

                                                                                                        Belém, 24 de maio de 2021 

A Sua Excelência o 

Senhor Vereador ZECA PIRÃO (José Wilson Costa Araujo)

 Presidente da Câmara Municipal de Belém 

Travessa Curuzu, 1755, Marco

Assunto: votação de proposição legislativa inconstitucional com potencial de causar danos ambientais urbanísticos de grande impacto no Município de Belém.

Excelentíssimo Senhor Presidente, 

Cumprimentando-o, vimos manifestar a Vossa Excelência e as Excelentíssimas Senhoras Vereadoras e Excelentíssimos Senhores Vereadores a preocupação do Ministério Público do Estado do Pará acerca da eventual derrubada do veto do Poder Executivo Municipal ao Projeto de Lei Complementar 01, de 21 de outubro de 2020, apresentado pelo Vereador Mauro Freitas, que dispõe sobre matéria ambiental urbanística e declara ter como escopo alterar dispositivos da Lei Complementar no 02, de 19 de julho de 1999, que “Dispõe sobre o parcelamento, ocupação e uso do solo urbano no Município de Belém – LCCU, e dá outras providencias".

Tomamos conhecimento, por meio de notícias publicadas pela mídia local e também pela informação recebida dos vereadores Fernando Carneiro, Bia Caminha e Lívia Duarte, que, em reunião realizada na quinta-feira (13 de maio de 2021), o Colégio de Líderes dessa Casa Legislativa, teria decidido encaminhar, para a votação do Plenário, o veto do Exmo. Sr. Prefeito de Belém ao indigitado projeto. A intenção, segundo pautado na imprensa e na mídia local, seria de orientar o Plenário a derrubar o veto ao Projeto de Lei. 

Naturalmente, nada temos a opor ou objetar quanto à tramitação regular do processo legislativo que inclui a avaliação e votação dessa decisão pelo E. Plenário. No entanto, nos dirigimos a V.Exas. para alertar sobre os vícios de natureza jurídica que esse processo legislativo e o conteúdo desse projeto apresentam, aí sim, para os quais apresentamos as objeções.

Do conteúdo da Proposta: O referido PLC acima mencionado propõe, em seu artigo 1o , a alteração do Inciso V, do § 1o , do artigo 98 da LCCU, de forma a incluir exceção à proibição de parcelamento do solo em Zonas de Preservação Ambiental e em Zonas de Interesse Urbano Especial, para áreas e empreendimentos que já se encontram parcelados e loteados antes da vigência da Lei no 8.655/2008 – Plano Diretor de Belém. 

Essa incluída exceção busca dar legalidade a eventuais parcelamentos de solo ou loteamentos executados em desacordo com a legislação vigente à época. Cabe destacar ainda que, com a entrada em vigência da Lei no 8.655/2008 – Plano Diretor de Belém, as definições do zoneamento foram totalmente alteradas, não só em sua nomenclatura, como nas delimitações, de tal maneira que, atualmente, qualquer eventual mudança sobre a proibição de parcelamento do solo só pode ser realizada no âmbito da revisão do Plano Diretor.

Já o artigo 2o do PLC procura realizar, com muita ousadia - posto que de modo enviesado - a alteração direta de conteúdo do Anexo X da Lei no 8.655/2008 – Plano Diretor de Belém por meio da alteração do Anexo 03 da Lei Complementar de Controle Urbanístico no 02/1999 para que a Zona do Ambiente Urbano – ZAU5 admita os modelos urbanísticos M0, M8, M9, M13 e M16 sem restrições de uso, quando coincidir com a zonas de orla Setores A1, A2 e A3. No entanto, tal Art. 2º do PLC se refere a conteúdo normativo que só existe na Lei nº 8655/2008 (Plano Diretor de Belém) !!! 

A proposta do PLC é a exclusão das notas de rodapé 1, 2 e 4 do quadro que especifica a modelagem em que se aplica a projetos com uso comércio atacadista/comércio varejista e depósito. Com efeito, as notas explicativas de natureza normativa existentes no Plano Diretor e referentes a aplicação desses modelos indicados, se aplicam a Comércio Atacadista e Depósito nas Zonas de Orla. 

A nota de rodapé 1 proíbe expressamente comércio atacadista e depósito na Zona de Orla setor 1, 2 e 3, ou seja, ao longo de toda a orla sul e da orla ao longo da Av. Pedro Álvares Cabral e parte da Rod. Arthur Bernardes. A nota de rodapé 4 permite Shopping Center na Zona de Orla setor 1 (Av. Bernardo Sayão). 

A redação apresentada pelo art. 2º do PLC se utiliza de má técnica legislativa, pois gera dúvidas sobre o alcance da supressão das notas de rodapé, além de enorme insegurança jurídica, pois altera pontualmente uma parte de um conjunto que só poderia receber um tratamento adequado, em termos de clareza, lógica e segurança, no processo de revisão integral da Lei nº 8655/2008. Assim, na prática, ao mutilar a lógica tanto do quadro de modelos (anexo X) quanto do quadro de parâmetros urbanísticos (anexo XI), torna inviável a aplicação jurídica do PDM e, dessa forma, promove a paralisação do processo de decisão administrativa, seja por seus próprios operadores, seja por gerar motivos suficientes de judicialização da matéria, a cada passo.

O artigo 2o do PLC dispõe ainda sobre alteração na definição dos serviços “C”, retirando o termo genérico “transporte” e o substituindo por transportes aquaviários, logística, portuário e retroportuário, e sem também apresentar sentido e justificativa para tal, novamente, altera dispositivo do Plano Diretor, pois, originalmente, o Anexo 03 da LCCU não contempla a definição de serviços “C”, ou seja, essa definição foi incluída somente no corpo da Lei no 8.655/2008 que é o texto que realmente está sendo alterado!. 

que o PLC propõe, com certo destempero e atabalhoadamente, em resumo, poderá se constituir em ato antijurídico e violação ao processo legislativo, arriscando a reputação dessa Legislatura, pois pode configurar, em tese, violação aos Princípios da Administração Pública, conclusão a que esse Parlamento certamente deverá chegar e, por isso, repudiar com veemência e desassombro. 

Inconstitucionalidade por vício no processo legislativo

 Além dos problemas já indicados, o principal vício do indigitado processo legislativo é a sua inconstitucionalidade.

 De fato, essa proposta, da forma como foi processada, é procedimentalmente incompatível com dispositivos da Lei Orgânica do Município de Belém, da Constituição Estadual e da Constituição República pela inexistência de participação popular e de estudos técnicos sobre a matéria que trata diretamente do desenvolvimento urbano, durante o processo legislativo. Vejamos:

 Lei Orgânica do Município de Belém: 

Art. 14. A Administração Pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes do Município obedecerá aos princípios de publicidade, legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e ao preceito da participação popular no planejamento municipal e demais princípios e normas das Constituições Federal, Estadual e desta Lei. 

§ 3º. Os conselhos e órgãos colegiados instituídos nesta e em outras leis municipais se constituem em órgãos de cooperação que terão a finalidade de auxiliar a administração na análise e no planejamento de matérias de sua competência. 

Art. 115. Constarão do Plano Diretor, a apresentação de um diagnóstico aos problemas de desenvolvimento, as diretrizes para sua solução com as respectivas prioridades da administração para curto, médio e longo prazo. 

Art. 116. A política urbana a ser formulada e executada pelo Município terá como objetivo, no processo de definição de estratégias e diretrizes gerais, o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a garantia do bem-estar de sua população, respeitados os princípios constitucionais federais e estaduais e mais os seguintes: I – ordenar e controlar a utilização, ocupação e aproveitamento do solo do território do Município, no sentido de efetivar a adequada distribuição das funções e atividades nele exercidas, em consonância com a função social da propriedade; II – atender às necessidades e carências básicas da população quanto às funções de trabalho, circulação,habitação, abastecimento, saúde, educação, lazer e cultura, promovendo a melhoria da qualidade de vida; III – descongestionar o centro urbano, através de incentivo ao fortalecimento e surgimento de subcentros de comércio e de serviços; IV – integrar a ação governamental do Município com a dos Órgãos e entidades federais, estaduais e metropolitanas e, ainda, com a iniciativa particular; V – otimizar o aproveitamento dos recursos técnicos administrativos, financeiros e comunitários do Município; VI – preservar o patrimônio ambiental e valorizar o patrimônio arquitetônico, artístico, cultural e ambiental do Município, através da proteção ecológica, paisagística e cultural; VII – promover a participação comunitária no processo de planejamento de desenvolvimento urbano municipal.

 Art. 117. O Plano Diretor aprovado pela Câmara Municipal é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. Parágrafo único. Na elaboração do Plano Diretor o Município deverá considerar a totalidade de seu território em seus aspectos físicos, econômicos e sociais, incluindo necessária e expressamente: I – programa de expansão urbana; II – programa de uso do solo urbano; III – programa de dotação urbana-equipamentos urbanos e comunitários; IV – instrumentos e suporte jurídico de ação do Poder Público através de normas de representação do ambiente natural e construído; V – sistema de acompanhamento e controle; VI – diretrizes para o saneamento. 

Art. 120. O Poder Público Municipal manterá órgão técnico permanente, para conduzir a elaboração e revisão do Plano Diretor, promover a implementação e acompanhamento de suas ações, bem como, estudo de impacto de vizinhança. 1º. Na elaboração e revisão do Plano Diretor e dos Programas e projetos dele decorrentes, o Poder Público promoverá audiências públicas, seminários e outras formas de participação com a sociedade civil organizada para colher subsídio a sua efetivação na forma da lei. (...) 4º. Fica assegurada ao órgão público competente a realização de audiência pública, antes da decisão final sobre o projeto, sempre que requerida, na forma da lei, pelos moradores e associações mencionadas no parágrafo anterior. 

Art. 126. O estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano deverá assegurar: (...) II – a preservação, a proteção e a recuperação do meio ambiente natural e cultural; III – a criação de áreas de especial interesse urbanístico e de utilização pública;

Art. 133. O Município assegurará a participação das lideranças comunitárias e de outros representantes da sociedade civil organizada, legalmente constituídas, na definição do Plano Diretor e das diretrizes gerais de ocupação do território, bem como na elaboração, implementação dos planos, programas e projetos que lhe sejam concernentes.

 Constituição do Pará:

 O art. 20 da Constituição do Estado do Pará, no título que trata da Administração Pública, estatui: 

Art. 20. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos poderes do Estado e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência, publicidade e participação popular. 

Nesse caso, como fica bem claro, o sentido do termo Administração Pública aí abrange a todas as funções do Poder Público e alcança não somente o Executivo Municipal, mas também o Poder Legislativo Municipal, que deve obedecer a todos esses princípios. 

Nos títulos que expressamente tratam da matéria urbanística e ambiental: 

Art. 236. A política urbana, a ser formulada e executada pelo Estado, no que couber, e pelos Municípios, terá como objetivo, no processo de definição de estratégias e diretrizes gerais, o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a garantia do bem-estar de sua população, respeitados os princípios constitucionais e mais os seguintes: (…) 

Art. 252. A proteção e a melhoria do meio ambiente serão, prioritariamente, consideradas na definição de qualquer política, programa ou projeto, público ou privado, nas áreas do Estado. 

Art. 253. É assegurada a participação popular em todas as decisões relacionadas ao meio ambiente e o direito à informação sobre essa matéria, na forma da lei. 

Constituição da República:

 Logo nos Fundamentos da República, inscritos no primeiro artigo da Carta, se declara a expressão da soberania popular tanto na via indireta, quanto na direta: 

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Na distribuição da competência, o tratamento da matéria urbanística ficou a cargo da União: 

Art. 21. Compete à União: (...) XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos; 

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. § 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. 

A definição e detalhamento dessas diretrizes foi realizada pelo Estatuto da Cidade: Lei Federal Nº 10.257, de 10 de julho de 2001 que, no que se refere ao tema aqui tratado, assim normatiza: 

Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. (...)

§ 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão: I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade; 

Ainda sobejam outros artigos protetivos que nos reservamos apenas a fazer a referência: Artigos art. 23, III, IV e VI, 30, VIII e IX, 37, 216, V, § 1o ., art. 216-A, X, e §2º, II, art. 225, §1º, III, todos da Constituição da República. 

Assim, não há a menor dúvida de que o processo legislativo em questionamento viola frontalmente a Lei Orgânica do Município de Belém e as Constituições do Estado do Pará e da República e as normas reguladoras aplicáveis. 

Note-se, desde já, que as Cartas Constitucionais estabelecem o entendimento claro de que quaisquer projetos ou propostas de normas que tratam de matéria urbanística devem realizar o procedimento democrático da participação popular garantindo, por sua matéria, a aferição da justiça ambiental e da qualidade da decisão. 

E, de fato, para ilustrar esse entendimento, que já é integrante da inteligência jurídica da matéria estabelecida pelo Poder Judiciário, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em decisão plenária, confirmou, mais uma vez, que qualquer lei de planejamento urbano municipal – não só o plano diretor e leis de zoneamento – tem de ser precedida de estudos técnicos e participação social em sua elaboração. 

A decisão que trazemos aqui é do mês de outubro de 2019, na Ação Direta de Inconstitucionalidade – Município de Osasco, proposta pelo ativo Ministério Público Estadual de São Paulo; ADI 2101166-80.2019.8.26.0000, com a seguinte ementa, onde fizemos os destaques:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Município de Osasco. Lei Complementar nº 283, de 11 de dezembro de 2014, revogando as alíneas “a” e “b” do inciso II do artigo 75 da Lei nº 1.485, de 12 de outubro de 1978, que estabelecia “os objetivos e as diretrizes para uso e ocupação do solo urbano”; (ii) Lei Complementar nº 285, de 11 de dezembro de 2014, revogando o inciso II do artigo 21 da Lei nº 2.070, de 08 de novembro de 1988, que estabelecia “os objetivos e as diretrizes para uso e ocupação do solo urbano”; e (iii) Lei Complementar nº 315, de 10 de novembro de 2016, que “cria nova modalidade de outorga onerosa do direito de construir, altera e acrescenta incisos ao caput do art. 2º da Lei Complementar nº 171, de 16 de janeiro de 2018”. 

OFENSA ÀS DISPOSIÇÕES DO ARTIGO 180, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. Reconhecimento. Leis impugnadas que, apesar de versarem sobre planejamento e desenvolvimento urbano (art. 180, II), foram votadas e aprovadas sem que seus respectivos projetos tenham sido (previamente) submetidos a estudos técnicos e participação popular. Exigência que abrange todas as hipóteses normativas de planejamento para ocupação e uso adequado do solo, ou seja, tudo quanto diga respeito a diretrizes e regras relativas ao desenvolvimento urbano, e não apenas as questões de zoneamento. Ademais, é o próprio texto constitucional que contempla mecanismos de fiscalização, a cargo do Poder Judiciário, para extirpar do ordenamento jurídico qualquer ato (de quaisquer Poderes do Estado) que lhe sejam contrastantes, como ocorre no presente caso, daí porque afastada a hipótese de invasão de seara reservada dos membros eleitos é de ser reconhecida a alegada inconstitucionalidade por ofensa às disposições dos mencionado artigo 180, inciso II, da Constituição Paulista. Como já foi decidido por este Órgão Especial, “a participação popular na criação de leis versando sobre política urbana local não pode ser concebida como mera formalidade ritual passível de convalidação. Trata-se de instrumento democrático onde o móvel do legislador ordinário é exposto e contrastado com ideias opostas que, se não vinculam a vontade dos representantes eleitos no momento da votação, ao menos lhe expõem os interesses envolvidos e as consequências práticas advindas da aprovação ou rejeição da norma, tal como proposta” (ADIN nº 994.09.224728-0, Rel. Des. Artur Marques, j. 05/05/2010). Inconstitucionalidade manifesta. 

Ação julgada procedente, com modulação.

Conclusão:

 Assim, no dever institucional de encaminhar nossa preocupação em razão da natureza da matéria e dos vícios de inconstitucionalidade do procedimento e considerando o dever de todos os agentes políticos realizarem a fiscalização da correta aplicação do direito e da ordem jurídica, recomendo e apelo ao Plenário dessa E. Casa a manutenção do veto do Poder Executivo Municipal ao Projeto de Lei Complementar no 01, de 21 de outubro de 2020.

Em síntese, o referido PLC altera o Plano Diretor do Município de Belém sem a observância dos ditames da Lei Orgânica do Município de Belém, da Constituição do Estado do Pará e da Constituição da República, bem como ao disposto no art. 40, §4º, inc. I da Lei Federal Nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade). Com a ausência dos estudos necessários e do debate público são vislumbrados somente os riscos das propostas apresentadas. 

Como destacado nas razões do veto e também aqui nesta peça, tais propostas, se viessem a ser aprovadas, causariam problemas graves tanto para a aplicação da norma na esfera administrativa, quanto nos riscos materiais gerados. Pois, o art. 1º do PLC propõe albergar no ordenamento jurídico municipal a lógica do fato consumado com o reconhecimento da legalidade de áreas não adequadamente tratadas, legalizando o parcelamento do solo em zonas de preservação ambiental e zonas de interesse urbano municipal realizados antes da Lei 8.655/2008. Também permitiriam a utilização de espaços de orla pelo comércio varejista/comércio atacadista e depósito, alterando drasticamente e colocando em risco o patrimônio ambiental, paisagístico e urbanístico do Município de Belém, bem como causando profundos transtornos na vida dos moradores da cidade. 

Nessa perspectiva, a Câmara Municipal de Belém, no exercício da parcela do poder que o Soberano lhe conferiu, deve garantir que esse mesmo Soberano possa ter sua participação, por meio direto, no momento adequado, com intuito de qualificar e legitimar a decisão final, pelo que é necessária a manutenção do veto. 

Recordo que, além dos mecanismos de autocorreção, para corrigir vícios como ocorre no presente caso e que esse PLC manifesta de forma tão veemente, a ordem constitucional resguarda mecanismos de fiscalização e controle com legitimação de vários operadores do Direito, a exemplo do Ministério Público, no âmbito do Sistema Judiciário, para extrair do ordenamento jurídico atos originados de quaisquer dos Poderes do Estado que sejam contrastantes com a higidez necessária da ordem jurídica. 

Caso seja colocado na pauta legislativa na próxima terça-feira, dia 25 de maio de 2021, solicito a urgente e imediata distribuição, de todo modo, desta comunicação a todos os Vereadores. 

Com respeito e apreço, 

RAIMUNDO DE JESUS COELHO DE MORAES 

Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo

sábado, 22 de maio de 2021

SOBRE O FOTOGRAFO FIDANZA

 

1902, Doca do Ver o Peso do Fidanza

Claudelice Macêdo  - 21 de dezembro de 2016 em 04:49 - Permalink

"Amei tudo, se quiser acrescentar algo, ele deixou um neto, que era o meu avô, fico feliz em ler um pouco mais sobre ele.
Obrigada! Parabéns pela pesquisa, lindo demais ler tudo isso.
Ass: tataraneta rssrssrrs"

http://brasilianafotografica.bn.br/?p=4274

Este artigo, ao qual ela se refere, não encontrei mais, porém,  como o tinha salvado, reproduzo porque é muito intressante.

"O Jornal do Brasil de 31 de janeiro de 1903 noticiou o suicídio do português Felipe Augusto Fidanza (c. 1847 – 1903), um dos mais importantes fotógrafos que atuaram no norte do Brasil no século XIX e no início do século XX: “Atirou-se ao mar, de bordo do vapor Christiannia, em viagem de Lisboa para esta capital (Belém), o conhecido photographo Felippe Fidanza” ( Jornal do Brasil, 31 de janeiro de 1903, na primeira coluna ). Ele havia se jogado ao mar na altura da ilha da Madeira quando retornava de Portugal com a mulher e os filhos. Havia viajado para cuidar de uma encomenda dos governos do Pará e do Amazonas de 10 mil álbuns de vistas destes estados. Parece que foi mal sucedido e já havia, inclusive, tentado se matar em Lisboa ( O Pharol, 6 de março de 1903, na quinta coluna).

Filho de Fernando Gabriel Fidanza e Maria de Jesus Fidanza, nasceu por volta de 1847, em Lisboa. Até hoje pouco se sabe de sua vida antes de sua chegada ao Brasil, em fins da década de 1860. Em 1º de janeiro de 1867, o Diario do Gram-Pará publicou o anúncio : “PHOTOGRAPHIA, ao largo das Mercez , nº. 5, Fidanza & Com”, o que prova que nessa época ele já estava estabelecido no Pará. Ainda em 1867, Fidanza realizou seu primeiro trabalho de importância nacional: o registro dos preparativos para a recepção da comitiva de dom Pedro II. O imperador foi ao Pará para participar das solenidades da abertura dos portos da Amazônia ao comércio exterior. Segundo Pedro Vasquez,  com esse trabalho, Fidanza “documentou de forma inovadora e antecipatória o espírito jornalístico”. No Diário de Belém, de 29 de agosto de 1868, há uma propaganda do ateliê Photographia Fidanza.

Destacou-se por sua produção de retratos e também pelo registro das paisagens e documentações do início do desenvolvimento urbano de Belém e de Manaus, ocasionado pela riqueza do ciclo da borracha.  Essas imagens de paisagens urbanas foram divulgadas por álbuns fotográficos encomendados pelos governos do Pará e do Amazonas. A modernização de Belém e do Pará foram registradas nas coleções Álbum do Pará (1899) e Álbum de Belém (Correio da Manhã, de 22 de outubro de 1903, na quarta coluna sob o título “Intendência Municipal de Belém). O Álbum do Amazonas (1902), cujo contrato havia sido assinado por Fidanza para o fornecimento de 6 mil álbuns ilustrados destinados à propaganda para o desenvolvimento daquele estado (Diário Oficial, de 16 de março de 1900, na segunda coluna sob o título “Indústria”), foi impresso em Paris sem a supervisão do fotógrafo e continha várias imperfeições, o que gerou uma série de comentários negativos sobre seu caráter. Aparentemente este fato pode ter sido uma das causas de seu suicídio, em janeiro de 1903.

Em seu estúdio, Fidanza fotografou tipos sociais diversos. Retratou no formato carte de visitenegros, mulatos e índios. Para tornar essas fotografias, que vendia, exóticas, utilizava adereços e construía cenários. Representou na capital paraense a firma Huebner & Amaral, sediada em Manaus, e foi um dos pioneiros do cartão-postal fotográfico no Brasil.  Seu estúdio era também palco de exposições de pintores que passavam por Belém para mostrar seus trabalhos.

Enquanto morou no Brasil, viajou várias vezes para a Europa, tendo sempre se mantido ligado às tendências internacionais da fotografia. Viveu a febre dos cartes de visite e dos cartescabinet. Participou da IV Exposição Nacional de 1875, com fotografias de orquídeas da região amazônica, e das Exposições Universais de Paris, em 1889, quando foi premiado com uma medalha de bronze, e de Chicago, em 1893.

Em sua produção fotográfica, Fidanza usou vários processos e sistemas de apresentação disponíveis em sua época, demonstrando conhecimento técnico e estético na escolha dos temas e dos enquadramentos, ângulos e composição do cenário, segundo as historiadoras Rosa Pereira e Maria de Nazaré Sarges. O trabalho de Fidanza reúne um acervo documental significativo para a história de Belém e de seus tipos sociais na segunda metade do século XIX e início do XX.

Cinco meses após sua morte, seu estúdio foi leiloado por sua viúva. Teve diversos proprietários, dentre eles os sócios Georges Huebner (1862 – 1935) e Libânio do Amaral (?-1920).  Segundo o jornalista Cláudio de La Rocque Leal, o estabelecimento fotográfico sob o nome “Fidanza” fez parte da história até 1969. Fidanza tornou-se uma marca da fotografia visto que, mesmo após a morte, seu nome permaneceu no cenário da produção fotográfica e na memória paraense, tanto que outros profissionais, ao adquirirem o seu ateliê, mantiveram o mesmo nome."

                       Perto do seu atelier... a direita onde foi a sapataria Carrapatoso.

Em 2018 tinhamos escrito a respeito, ACONSELHANDO A LEITURA DO ARTIGO QUE HOJE NAO SE ENCONTRA MAIS.

https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2018/10/o-suicidio-do-fotografo-felipe-augusto.html

Nesse tem algumas de suas fotos, também.

 


terça-feira, 11 de maio de 2021

GOVERNO DA CIDADE...

 

... e da Área tombada.


Entramos no quinto mês do novo governo da cidade e notamos com prazer que, o art. 216.V.1 da Constituição foi lembrado com a criação do Conselho da Cidadania e do Tá Selado. De fato, ali é previsto que: “o Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro...”

O Estatuto da Cidade, ou seja, a Lei Federal nº 10.257, é outra norma que dispõe sobre a gestão democrática da cidade.  De fato, confirma que a política urbana deva ter por objetivo ordenar democraticamente o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. Se nota isso, claramente, no seu art. 2º II quando prevê a: “gestão democrática por meio da participação da população e de associações representatividade dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano...”

Partindo desses princípios, consideramos justíssimo e respeitoso sermos chamados, como Associação de Moradores, para discutir desde modificações de leis que tenham a ver com o nosso dia-a-dia: arborização; calçadas; poluição sonora; orla; etc. etc. etc.

SERIA O CASO DE CRIAR UM PORTAL DA TRANSPARÊNCIA PARA ESSES DOIS NOVOS AGLUTINADORES DE CIDADANIA.

Há anos esta Associação chama atenção sobre dois problemas muito presentes na área tombada da Cidade Velha: uso irregular das calçadas e a poluição sonora, sem qualquer resultado. Durante a campanha eleitoral, fizemos uma relação dos problemas principais da Cidade Velha, entre os quais estavam os dois acima citados. Reiteramos essa realidade.

CALÇADAS: com tantos órgãos públicos na entrada do bairro da Cidade Velha, o problema do estacionamento é enorme.  Não somente funcionários públicos estacionam nas calçadas, dando maus exemplos a outros incivis,  mas também o uso delas para exposição de mercadorias ou colocação de mesas e cadeiras de bares/restaurantes.



Será que ninguém reparou a largura das calçadas na área tombada, principalmente da Cidade Velha? Somente temos uma calçada que supera um metro de largura. Mesmo assim, vemos abusados usando mesas e cadeiras, tirando direitos dos pedestres, até atrapalhando o transito. Será que so os ribeirinhos, frequentadores da Siqueira Mendes e Dr. Assis notam isso?

Mas, outros comerciantes também abusam desse comportamento ocupando a calçada com produtos que vendem, e mais uma vez, aos pedestres é tolhido um direito que as leis estabelecem que é deles... Esse problema  porém aumentou depois que modificaram o Código de Posturas, que é uma lei, através de um decreto, que normatizava os ambulantes... e ninguém notou que tal decisão era juridicamente nula. 

Será possivel que so comerciante tem direitos? E o cidadão que reclama ha anos disso o que vê? Dai para outros abusos foi um passo...A norma urbanistica que falava de 1,20m não existe mais? Para fazer garagens, aproveitaram para dispor o acesso ou a entrada a elas, através de superfícies inclinadas, destruindo as calçadas e, mais uma vez tolhendo direitos dos pedestres.





















 
E os degraus que apareceram depois do aumento do asfalto no meio da rua que levava a agua da chuva a entrar nas lojas? Cada comerciante levantou a sua calçada, cobrindo as pedras de liós impedindo assim quem usa carrocinha a usa-las... e  ninguem fez nada. 




















Hoje, modificar o Código de Postura mencionando somente bares e similares,  enfim, interesses de alguns  comerciantes, deixa em aberto, e sem solução, os outros problemas que criaram aos pedestres, ou seja, a tantissimos outros cidadãos. 

É esse o incentivo do poder público à reconstrução das calçadas por parte dos cidadãos? Por que não é a Prefeitura a cuidar disso, em vez do proprietario da casa em frente a elas? E pior: porque a cidadania não é  ouvida quando se fala de algi que tira direitos aos cidadãos?

POLUIÇÃO SONORA: é de 1990 a primeira resolução do CONAMA que dispõe sobre critérios de padrões de emissão de ruídos de todos os gêneros. Foram considerados prejudiciais à saúde e ao sossego público, os ruídos com níveis superiores aos considerados aceitáveis pela Norma NBR-10.151 - Avaliação do Ruído em Áreas Habitadas visando o conforto da comunidade, da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.

“A legislação básica aplicável referente à poluição sonora é a seguinte: artigo 225 da Constituição Federal; Lei n.º 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente; Decreto nº 99.274/90 que regulamenta a Lei nº 6.938/81; Resolução CONAMA nº 001, de 08.03.1990, que estabelece critérios e padrões para a emissão de ruídos, em decorrência de quaisquer atividades industriais; a Resolução CONAMA nº 002, de 08.03.1990, que institui o Programa Nacional de Educação e Controle de Poluição Sonora - Silêncio, e as Normas de nºs 10.151 e 10.152 da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.”

Considerando que a deterioração da qualidade de vida, causada pela poluição, está sendo continuamente agravada nos grandes centros urbanos; no ano 2000 foi feita uma tabela com o nível de critério de avaliação NCA para ambientes externos em DB, dividindo o território em  seis áreas diferentes, variando de 35 a 70 decibéis.

Para a área mista, predominantemente residencial, era previsto 55 decibéis durante o período diurno, e 50 naquele noturno... e aqui situamos o bairro da Cidade Velha e a Campina. Esta norma vale até hoje, mas não em Belém... Por que? Por acaso é uma opção para  a administração local adota-la, ou é uma obrigação? 

O nosso patrimônio continua sendo prejudicado com eventos, inclusive promovidos por órgãos públicos, que superam os 120 decibéis. Em frente às portas de igrejas tombadas continuam festejando santos e noivas com saraivadas de fogos de artifício, ruidosos. Os trios elétricos em frente a ALEPA. MEP  e  IHGPA, com as reivndicções economico-salariais, superando os cem decibeis, também fazem sua parte.  Todos exemplos que prejudicam, além dos anciães, cães e outros seres vivos, e agridem muito pessoas com espectro autista.

Já faz parte de nossa experiência ver modificações de leis que não abrangem o problema inteiro... Por esse motivosolicitamos que a Constituição e o Estatuto da Cidade sejam respeitadosa cidadania deve  ser chamada para opinar a respeito  de problemas da cidade,  antes de mandarem para a Câmara de Vereadores os projetos de lei. 


Talvez fosse até oportuno acionar os dois Conselhos acima citados, para esses casos, também.


sexta-feira, 7 de maio de 2021

SAUDADE DAS VIGILENGAS...

 ESTÁ NASCENDO, SEM QUERER UMA HOMENAGEM  A NOSSA HISTORIA.

1- VER-O-PESO 

2- VIGILENGAS


...O MERITO É DO "NOSSO BOTO"  COM SUAS IDEIAS E AS TROVAS ... DOS OUTROS.

Ao longo da costa brasileira, vários tipos de embarcação foram surgindo. Além das  nossas vigilengas, temos “ jangadas a remo, até as que usam duas velas, passando pelos cúteres do Maranhão, os saveiros da Bahia, as canoas de tolda do São Francisco, as canoas de convés de Laguna”.


Elas, as Vigilengas, as barcas a vela, fazem parte da lembrança de quem superou o meio século de idade. Numerosas eram as embarcações providas de velas que coloriam a doca do Veropeso. Cada região ostentava nas suas canoas, pinturas diferenciadas, como um tipo de identidade local.

Com o desenvolvimento de Belém, pouco a pouco vimos  as velas desaparecerem das barcas e...do Veropeso. A chegada dos motores de popa possibilitou que, até o possuidor de um barquinho pudesse atravessar rapidamente o rio e trazer seus produto para o mercado.

Os po-po-pós aumentaram e as velas colorids atravessando o rio, desapareceram.

VIGILENGAS: QUEM LEMBRA?

de Antonio Juraci Siqueira a quem agradecemos por nos ajudar a relembrar.

Manuel Bandeira escreveu: Nunca mais me esquecerei/ Das velas encarnadas /Verdes /Azuis/ Da doca de Ver-o-Peso/ Nunca mais.

Quando menino fiz algumas viagens do Cajari pra Belém a bordo da canoa freteira Flor do Cajari. Nesse tempo, há mais de 60 anos, era raro ver embarcação motorizada.Tanto as freteiras quanto as vigilengas, canoas pesqueiras típicas do município de Vigia, eram movidas à vela. Lembro do espetáculo que era ver, pela manhã, quando as canoas içavam âncoras para o reinício da viagem, velas de todas as cores e formatos, veria poemas concretos, borboletas coloridas voando sobre as águas do Marajó...
Hoje, essa visão faz parte do passado e as veleiras só vogan na lembrança deste velho caboclo que, em menino, sonhara ser canoeiro. Agora, essas canoas, com raras exceções, são motorizadas, desde as usadas para transporte de cargas e passageiros às de pesca, incluindo cascos, batelões e montarias.
Ontem postei aqui as trovas premiadas no II Concurso Paraense de Trovas sob o tema Ver-o-peso e hoje, em atenção ao pedido da amiga Dulce Rosa Rocque , postarei as trovas sob o tema Vigilenga, do mesmo concurso, ocorrido em 1986 quando eu era presidente da União Brasileira de Trovadores seção de Belém. As trovas foram publicadas nos Cadernos de Cultura da Semec, que patrocinava os concursos. Dos 16 trovadores premiados, 4 permanecem entre nós e 12 já habitam a outra dimensão.
TROVAS SOBRE VIGILENGAS
Sozinho no baluarte
do cais me ponho a cismar:
- a vigilenga que parte,
faz a saudade aportar!...
( Alfredo Garcia)
Sou vigilenga perdida,
fustigada pelo vento,
vivo vagando na vida
num vendaval de tormento.
(Ana Maria Freire)
Mil pétalas coloridas
que o vento vai carregando,
são vigilengas floridas
pelos rios navegando.
(Benjamin Camarão)
Esbarrei na tua ausência
vigilenga abandonada.
Teu nome, agora, é carência,
saudade desesperada.
( Celeste Proença)
Vigilengas vêm das ilhas
carregando produção,
trazendo, de muitas milhas,
saudades no coração.
(Helder Moreira)
As vibrações do universo
fez de meu mundo um altar:
das vigilengas meu verso;
das santas águas, meu mar.
( José Eimar Monteiro)
Tudo que a vida me nega,
nas páginas recomponho,
vogando com minha lira
na vigilenga do sonho.
(José Ildone)
Vigilenga... És fantasia
e no mar és flor em aste...
Quando levaste a Maria,
o coração me levaste.
(Leonan Cruz)
Inspiração colorida,
vigilengas a bailar...
Na chegada ou na partida,
poemas à beira-mar.
(Maria de Lourdes Cardoso)
Com lindas velas infladas,
vigilengas cruzam mar.
Veleiras das madrugadas,
companheiras do luar
(Osmar Arouck Ferreira)
Vigilenga, as tuas velas,
desfraldas nas baías,
estão cheias, quantas delas,
de saudade das Marias!
(Roberto Rodrigues)
Outrora, meio capenga,
andei só, em desatino,
tal qual uma vigilenga
pelos mares sem destino.
(Roseli Sousa)
Vigilenga, a tua sina,
pelos portos das cidades,
é ir e vir na surdina,
levar e trazer saudades.
(Sebastião Godinho)
Vigilenga, és canoinha
pescando sonho, ilusão,
no Ver-o-peso, à tardinha,
na maré do coração.
( Sylvia Helena Tocantins)
Vigilenga se afastando,
na madrugada sombria,
busca o sol que vem raiando
só pra dizer-lhe: - Bom dia!
(Thereza Nunes Bibas)
Vão no vento navegando
as vigilengas singelas...
Lenços brancos acenando
com o adeus de suas velas!.
(Zinalda Castelo Branco)
***
Bom dia, meu povo!
Faz que nem as vigilengas durante os temporais: te aquieta!

Obrigada por me ajuda a salvar  essa memória.              













    Fotos de amigos e da internet.

            


quinta-feira, 6 de maio de 2021

VER O PESO DE TANTO AMOR!

 Estes dias começaram uma limpesa profunda na doca do Ver o Peso. Todos aqueles que gostam de Belém so podem ficar satisfeitos com isso. Um motivo a mais para nossos poetas aproveitarem...mais uma vez.

Somos da opinião que, mais passam os anos, mais experiencias e lembranças acumulamos e isso, se registrado, serve para salvar nossa memória histórica.

Também somos da opinião que  os nossos "mais velhos" deveriam ser melhor utilizados. Suas recordações deveriam ser salvaguardadas, para ajudar a...não esquecer  nosso passado, nem deixar piorar mais ainda.

O nosso "boto", nos deu essa oportunidade hoje, lembrando sua primeira viagem para Belém, num barquinho. Recorda, desse modo, o tempo em que as barcas tinham velas que enfeitavam a doca do Ver o peso...

Mario de Andrade gostou do que viu tanto que escreveu: Que alegre porto, Belém do Pará! Que porto alegre, Belém do Pará! Vamos ao mercado, tem mungunzá! Vamos à baía, tem barco veleiro! Vamos às estradas que têm mangueiras! Vamos ao terraço beber guaraná!

A visão que teve do Veropa, levou em vez Antonio Juraci Siqueira, anos depois, a fazer uma homenagem a Belém, através de outros tantos admiradores desse nosso recanto... Leiam aqui.

VEM VER O PESO DO MEU AMOR!
Se alguém quiser ver o peso
do amor que sinto por ti,
basta falar com desprezo
do encanto que existe aqui!
De todos os recantos de Belém, o Ver-o-peso, sem dúvida alguma, é o de minha predileção. Menino do interior, vim a Belém pela primeira vez aos dez anos de idade em companhia de meu padrinho José Siqueira e do meu padrasto José Oliveira, a bordo da canoa freteira Flor do Cajari. Impossível descrever com palavras o que senti ao avistar, da canoa, as luzes da cidade refletidas na baía do Guajará...

Belém dançava sob as águas e ganhava vida ao passo que a canoa se aproximava do cais: ruídos de motores, buzinas de carros, música e propagandas comerciais nos alto-falantes e, finalmente, o burburinho humano da doca do Ver-o-peso. Belém, enfim, ali diante dos meus olhos!

Foi amor à primeira vista! Fiquei um tempão no convés bebendo tudo com os olhos e ouvidos. Tudo era mágico e maravilhoso diante do caboclinho tuíra de sol. Dos letreiros coloridos de neon à multidão de canoas de todos os tamanhos e formas que disputavam lugar na doca. Fui dormir embalado por essa magia e acordei com o vozerio vindo da feira e do mercado de ferro. Vontade doida de sair da canoa e me misturar à multidão.

Por volta das sete horas, Deco, o cozinheiro da Flor do Cajari, foi ao mercado comprar peixe para o almoço e me levou com ele. No trajeto da canoa ao mercado, totalmente zonzo por estar pisando pela primeira vez em terra estranha, fui trombando com as pessoas entre o dilema de olhar para os lados ou me manter firme nos calcanhares do cozinheiro para não me perder no meio do povo. Deco comprou piramutaba que o peixeiro habilmente embrulhou em folhas de guarumã, pois na época não se usava os famigerados sacos plásticos. Passei o resto do dia na canoa, só na mutuca, macuricando tudo. Voltei pro Cajari mas deixei meu coração no Ver-o-peso.

Depois disso, muita água passou por baixo da ponte existencial até fevereiro de 1976 quando aportei definitivamente em Belém, atando minha canoa na “Felicidade”, pequena passagem no bairro da Condor, onde cultivo e compartilho sonhos na tentativa de tornar mais leve e colorido o fardo dos dias.

Em 1986, então presidente da União Brasileira de Trovadores, seção de Belém, promovi e coordenei o II Concurso Paraense de Trovas sob os temas: Ver-o-peso e Vigilengas. Aqui, as trovas premiadas sobre o Veropa. Detalhe: dos 15 autores premiados, 11 já habitam a Mansão Celestial.
No Ver-o-peso o feitiço,
vigilenga, erva cheirosa,
o preto, o branco, o mestiço...
Ah!, que mistura gostosa!
( Affonso Pinto da Silva)
No Ver-o-peso da vida,
eis um fato singular:
os barcos vão de partida
para a saudade chegar...
(Alfredo Garcia)
Ver-o-peso, a tua imagem
gravada no meu olhar,
até parece miragem
brincando à luz do luar.
( Ana Maria Freire)
No Norte sempre brilhaste
com fulgor que ninguém tem
e o Ver-o-peso é o engaste
dessa estrela que és, Belém!
( Benjamin Camarão)
Teu nome tem tanta luz,
Ver-o-peso enluarado,
que o próprio sinal da cruz
se agasalha deslumbrado.
(Celeste Proença)
Oh! Ver-o-peso querido,
lugar de felicidade,
um belo jardim florido
da nossa bela cidade!
( Creuzalina da Cruz)
Ver-o-peso esplendoroso,
belo cenário de eventos,
cartão postal buliçoso
de risos e sofrimentos.
( Gerson Ferreira)
Ver-o-peso... Pôr de tarde...
Quebram-se as ondas no Forte
se queixando da saudade,
da saudade do meu Norte.
(José Eimar Monteiro)
Pesa-me tanto desprezo
de quem fiz a preferida...
Acho até que errei o peso
no Ver-o-peso da vida.
(José Ildone)
Frutos da terra empilhados,
cuias , paneiros também.
Poemas amontoados
no Ver-o-peso, em Belém.
( Maria de Lourdes Cardoso)
Deus pintou a natureza
com tintas que idealizou,
e o resto dessa beleza
no Ver-o-peso deixou.
( Roberto Rodrigues)
Em Belém eu fiquei preso
pela paisagem postal
da Doca do Ver-o-peso
na sombra do mangueiral
(Rufino Almeida)
Cada vela colorida
no Ver-o-peso risonho,
é um retalhinho da vida
da capital do meu sonho!
( Sylvia Helena Tocantins)
Ver-o-peso, vou cantando,
rimas ao léu na poesia,
minha balança pesando
retalhos de fantasia.
( Thereza Nunes Bibas)
Mal desponta a madrugada,
o Ver-o-peso desperta!
Febril colmeia agitada:
- Belém, a porta está aberta!
( Zinalda Castelo Branco)
***
Bom dia, meu povo!

OBRIGADA AO NOSSO BOTO: ANTONIO JURACI SIQUEIRA
Maria Helena