quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

ENCONTRO DOS POVOS: BRASIL-ÁUSTRIA

Nem tudo do que acontaece no mundo nós sabemos.

Que tal descobrir o que Fernando Aruaujo, nosso conterraneo que vive na Austria, nos conta..

24/11/2024 - RAÍZES INDÍGENAS - ENCONTRO DOS POVOS: BRASIL-ÁUSTRIA

Gostei de imaginar que ao longo das apresentações do 12° Brasilianisches Kulturfestival Wien 2024 (12° Festival Cultural do Brasil em Viena - edição 2024), nesse encontro de povos e nações com suas raízes indígenas, me encontrava bem posicionado no Forum do monumental Weltmuseum Wien (Museu do Mundo de Viena), observando de perto o interesse que a Amazônia ora desperta em todo o mundo - em especial na Europa -, despertar esse associado a uma destemida reafirmação da vida, a uma reintegração existencial desta Terra como se fosse um começar de novo do planeta e daí, a uma definitiva negação da morte, diante do desastre ecológico do qual estamos.
Adotando a forma de víbora massacrada, colorida e rastejante, triste e alegre, dela ouviram-se, desde o século XV, os brados das injustiças cometidas pelos invasores europeus contra os povos originários da Abya Yala - chamada por eles de América -, aquilo que séculos depois ainda ouvimos descendo do desastre que entre nós representou o governo Bolsonaro. Aquilo que Edileuza Penha & Marcelo Cuhexe Krahô em filmes, nos fizeram assistir, o genocídio mostrado à luz das imagens de “Nosso Solo, Nossa Terra”, no “Aguyjevete Avaxi'i”, de Kerexu Martim, no “A Febre da Mata”, de Takumã Kuikuro, no “Levante pela Terra”, de Marcelo Cuhexe Krahô, no “O que me Leva Não é Mercadoria de Bolso”, de Bárbara Matias Kariri, dos cerca de 40 milhões da nossa gente indígena e quilombola vitimada pela ambição e crueldade dos homens desses séculos.
É então nessa serpente, onde na dança de Franci Gruteser, “Cunhã Poranga” e nos trabalhos das Escritoras Ajebianas de Rondônia, representadas pela dra. Flaviana Garcia e curadoria de Izabel Cristina da Silva, brincam as crianças e nela reside agora a confiança de ver no governo Lula a rebelião renascer pelas asas de morcegos encantados que ao som de música de aldeia e de uma deusa protetora dos sonhos, desde já lhes asseguram que as povoações ancestrais não mais serão palco das cenas onde, por sua porta da frente entram pastores evangélicos negando a fé, a língua e a cultura dos povos originários e pela porta dos fundos, o garimpo ilegal via mercúrio derramado nos rios, as madeireiras associadas ao agronegócio dizimando a floresta, as mineradoras extrativistas de tudo violentando o solo, os agentes de traficantes de animais e vegetais da biodiversidade e o crime organizado lucrando com o tráfico das drogas e o contrabando de pedras preciosas, todos trazendo no umbigo e nas línguas o mesmo gosto amargo do velho colonialismo e as cores nefastas dos nossos dias, neoliberais crentes do imperialismo.
Nessa mesma linha, que lhes diz que a natureza não é apenas um recurso para gerar dinheiro, mas imprescindível para a sobrevivência do homem, 2 fotógrafas e 18 artistas plásticos do Brasil inauguraram nesta segunda-feira (25) na Galeria Spektakel uma mostra coletiva onde, diante do renovar da vida, Marcelo Cuhexe Krahô deixou seu canto, o vinho branco foi servido em cuias e nos trabalhos expostos, o talento daqueles que fazem de sua arte um terreno fecundo no qual é possível vermos o brilho da estrela que carregam ainda que a noite esteja nublada.
Com texto, vídeos e fotos, como linguagens complementares, faço a narrativa deste evento como uma singular manifestação do engenho de Vanessa Tölle&Michael Tölle, à frente do Verein (Clube) PAPAGAIO, quando trazem da ribalta para o palco a Sala Curumim, em parceria com Elaine Bonfim, “Die Schlange Verbindet die Welten” (A Cobra Conecta os Mundos) e Izabel Cristina da Silva “Flussdelphin Amazoniens” (Boto da Amazônia), um espaço para as crianças, seguido de palestras e apresentações sobre temas de arte, cultura e ciência com a participação de grupos indígenas do Brasil, e de um punhado de mestres, doutores, cientistas e estudiosos das universidades UNIRIO (Rio de Janeiro), Stanislau (California State-USA) e Rede BRASÖS presente na Áustria, Eslováquia e Eslovênia.
Gosto de pensar, por fim, que tudo o que neste Festival de arte e cultura brasileiras pude acompanhar, no canto solo de encerramento de Bernardo Lobo, “Bons Ventos” e tanto descendo das Bachianas Brasileiras, de Heitor Villa-Lobos quanto do Canto das Três Raças, de Mauro Duarte e Paulo César Pinheiro que a soprano Luciene Weiland cantou, o sonhar aquilo que ainda “ninguém ouviu, um soluçar de dor no canto do Brasil, um lamento triste que sempre ecoou desde que o índio guerreiro foi pro cativeiro e de lá cantou…, e o negro entoou um canto de revolta pelos ares no Quilombo dos Palmares onde se refugiou” para que isso não soe mais como uma agonia, mas como um hino de esperança, um cântico de alegria e não mais um soluçar de dor.
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Um comentário:

JOSE F F RAMOS disse...

Muito bom esse texto.