quarta-feira, 4 de outubro de 2023

EDUCAÇÃO: um agente transformador.

 

A cidade de Belém tem três manifestações culturais de rua, apreciadas e muito concorridas e que se desenvolveram no bairro da Cidade Velha. Falamos, em ordem alfabética, do Arraial do Pavulagem, do Auto do Círio e do Carnaval.

Todos os moradores da área tombada do bairro, que é aquela usada e abusada por esses eventos, os apreciam e até frequentam. Porém, isso não inibe ninguém de reclamar da parte negativa que acabam tendo essas manifestações.

Tratando-se de área tombada, hoje, algumas normas deveriam ser respeitadas, a começar com a necessidade de evitar “ruídos e vibrações”, exagerados. O barulho causado pelos instrumentos musicais provoca vibração e o transito de carretas provoca trepidação, consequentemente, ambos provocam danos ao patrimônio histórico e também ao ser humano. Não precisa proibir, mas evitar danos, sim. Bastaria respeitar as leis.

- O Arraial do Pavulagem trazia cerca de 10.000 pessoas para a praça do Carmo, para a frente de uma igreja construída por Landi em meados do século XVIII. Para chegar até lá, passavam pela igreja de Sto Alexandre e pela igreja da Sé. Ambas também passaram pelas mãos de Landi, em 1700... e não é que paravam os ruídos por esse motivo.

O Arraial tinha um comportamento bastante civil, pois se preocupava com a presença de banheiros químicos, com limpeza da praça e com a dispersão das pessoas após o espetáculo. Conversa vai conversa vem, chegaram a conclusão que, realmente os ruídos provocados pelo evento não ajudavam a salvaguarda, defesa e a proteção daquela igreja tão antiga. Até hoje agradecemos a sensibilidade e civilidade daqueles que resolveram mudar de área com tal evento.

- O que acontece com o Auto do Círio, em vez, é muito pior, porque durante alguns anos até os ensaios eram feitos na praça em frente a já citada igreja do Carmo, durante o mês de setembro... Insistentes reclamações por tal falta de respeito ao patrimônio não foram levadas em consideração. O cortejo iniciava na praça do Carmo, de onde saia depois de umas três horas de concentração, já com os “tambores rufando” e  superando cem decibeis. 

Criado para revitalizar o Centro Histórico de Belém, a partir das festividades do Círio de Nazaré, foi, ano após ano, se transformando num evento que chegava a ter cerca de 60 mil espectadores/seguidores. Todos os monumentos tombados mais antigos de Belém, eram ponto de parada visto o trajeto feito saindo da Praça do Carmo. O itinerário continuava pelas ruas Dr. Assis, Padre Champagnat /Largo da Sé, Tomázia Perdigão até a praça D. Pedro II, em frente aos palácios Lauro Sodré e Antônio Lemos, local da apoteose e encerramento do Auto. Os ruídos superavam os cem decibéis, em tais paradas... a que propósito? 

É o caso de lembrar que nessa área, a esse evento se juntam, durante o ano inteiro, outras manifestações.  Em frente da ALEPA, as reivindicações de trabalhadores, por exemplo, são feitas usando trios elétricos, que também não respeitam os limites de decibeis previstos nas normas em vigor.

A Cidade Velha sempre foi fonte de carnavalescos que de lá saiam em direção às ruas do centro. Entrando nos anos 2000, o Eloy Iglesias e o Kaveira ocuparam a parte do bairro, ainda não tombado pelo IPHAN, e o animavam com suas bandinhas e mascarados. Outros blocos com essa mesma ideia de salvaguardar o nosso carnaval tradicional também passavam pelo bairro, para alegria e diversão dos moradores.

Em 2012 as coisas mudaram. O governo eleito para a cidade autorizou os trios elétricos e praticamente expulsou o “nosso” carnaval mais autêntico, dando início a invasão da Cidade Velha pelos abadás e outros elementos copiados do carnaval de outras regiões ... Tem início o caos: num domingo a Praça do Carmo tinha uns dez trios elétricos tocando músicas de todo tipo, alto e...não as marchinhas a que estávamos acostumados.  

Os anos sucessivos foram piorando a situação e um grupo, bem forte economicamente, se apossou do bairro modificando totalmente o carnaval a que estávamos acostumados. Mesmo após o tombamento da área pelo Iphan nenhuma atenção foi dada aos abusos que víamos acontecer naquelas ruazinhas. A Civviva, associação de moradores que tentava defender o patrimônio histórico, foi a primeira a ser excluída das reuniões com a Secretaria de Segurança, quando a discussão era o carnaval. 

Mal ou bem, o carnaval passou para a Tamandaré, ou seja, para o entorno da área tombada... e novos problemas vieram a tona e deveriam ser resolvidos no carnaval seguinte, mas chegou a PANDEMIA. 

Então: VISTO QUE A POLUIÇÃO SONORA É CONSIDERADA UM CRIME AMBIENTAL, por que insistir em deseducar os cidadãos ignorando as normas em vigor? Os tres exemplos dados são fontes de desrespeito generalizado. Se reconhecemos que a poluição sonora com seus ruídos e vibrações, provoca a degradação da qualidade ambiental, porque não evitar isso? Não estamos pedindo para acabar com a música ou outra fonte ruidosa de arte ou de defesa dos trabalhadores, mas de fazer o possível para ficar dentro do que as leis em vigor recomendam... ao menos. 

Resulta que cabe aos Municípios legislar sobre os aspectos aplicáveis a convivência urbana, tendo como base as normas técnicas editadas e atualizadas pelos órgãos normatizadores, ou seja, pela ABNT e o INMETRO. A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) definiu, há alguns anos, índices de poluição sonora aceitáveis. Em zonas residenciais urbanas, o limite é de 55 dB de dia e 50 dB à noite. 

Queremos salvaguardar e proteger nosso patrimônio? Por que não aplicar esses indices, ao menos na área tombada de Belém? Até os sinos das igrejas podem seguir esse exemplo, visto que muitos já são... eletrônicos.

Sem vigilância, nem algum tipo de controle, até os fogos ruidosos continuam sendo usados apesar da recente lei estadual proibindo-os... somando-se, assim,   aos outros exemplos dados, cujas consequências negativas abrangem, não somente o patrimônio histórico e ambiental, mas as casas dos cidadãos e os seres vivos também.

A educação é um dos  grandes agentes transformadores que pode ser usado nestes casos.


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