Recebemos do Vice-Presidente da Civviva, o turismólogo, arquiteto e urbanista Pedro Paulo dos Santos, os “Comentários sobre o documento Promoção de Arquivamento do MPPA, ref. ao IC n° 000030-113/2013", do empreendimento Atacadão.
Por achar neste momento interessante e uteis tais comentários, o reproduzimos abaixo:
“A partir da imoral proposta de TAC para consolidar todos os abusos e
ilegalidades cometidos pelo empreendimento ATACADÃO, apresento alguns
comentários pertinentes.
Foi instaurado Inquérito Civil n° 00030-113/2013, na 2a. Promotoria de
Justiça do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação, e Urbanismo;
supostamente para apurar a construção irregular e ilegal do Atacadão no Portal
da Amazônia. Ratificando toda a situação de infração de várias leis, foi
exarado um despacho em 11.12.2020, promovendo o arquivamento do procedimento.
Vale ressaltar a situação de gritante ilegalidade, porquanto, foram
desobedecidos diversos normativos vigentes, a saber:
- Constituição da República Federativa do Brasil, art. 216, V, § 1°;
- Lei Orgânica do Município de Belem, art. 38, IV; art. 116, VI;
- para conseguir uma solução justa, legal e racional para o conflito, todas as partes prejudicadas, como a comunidade do local e a sociedade civil em geral teriam que ser ouvidas; mas, isso não aconteceu, em desobediência ao que determina a Lei Federal n° 10.257/2001, art. 2°, inciso II; e a Lei Orgânica do Município de Belém (de 30.03.1990), art. 108, II; art. 116, VII; art. 136, parágrafo único; art. 228, §1°;
- No parágrafo da pág. 7 do ato em questão, que transcreve o final da análise técnica n° 561/2020 do GATI, discordo das conclusões da tal análise, lembrando que, sendo a FUMBEL "responsável pelo fomento e disseminação ... e do patrimônio histórico dentro da capital paraense", JAMAIS poderá admitir a flexibilização do gabarito de qualquer empreendimento, como a que ora concede para o caso ilegal do Atacadão, nem aceitar quaisquer arranjos que supostamente melhorariam "o aspecto paisagístico exigido na zona de orla", pois, é inegável que a volumetria da edificação compromete sim, de forma intensamente negativa a ambiência, a legibilidade, a visibilidade, e a preservação do Centro Histórico de Belém;
- Ainda na pág. 7, no parágrafo assim iniciado "Neste ponto é
importante destacar alguns aspectos técnicos que levaram o setor de engenharia...",
devo ressaltar que o caso em tela deveria ser analisado por arquitetos e
urbanistas, e não por engenheiros, os quais não têm formação adequada para
analisar aspectos relacionados a patrimônio histórico, cultural e artístico, o
que, talvez, tenha gerado aparentemente uma sequência de equívocos e
inconsistências na análise desse caso;
- No parágrafo que começa na pág. 10 e continua na pág. 11 e que se inicia assim "Ademais, sobre o gabarito do empreendimento Atacadão...", o documento afirma equivocadamente que a principal finalidade da Lei n° 7.709/1994 seria "conter o adensamento populacional", quando na verdade, a principal finalidade da lei é a "proteção e preservação do patrimônio histórico, artístico, ambiental e cultural do município de Belém...". E portanto, a lei tem que impedir sim a instalação de empreendimentos que interfiram negativamente ou agridam uma paisagem urbana onde predominam edificações dotadas de valores históricos, ou de características estilísticas diversas daquela que se pretenda inserir;
- No parágrafo que inicia na pág. 11 e continua na pág. 12, e que começa assim "2) No entorno imediato à obra...", a existência de outras edificações já consolidadas, com gabarito "equivalente ou até maior que o Atacadão", não justifica em nenhuma hipótese a tolerância à inserção de outro empreendimento com gabarito acima do permitido em lei. Outro equívoco: diferente do que afirma o documento, naquela área a lei não permite gabarito acima de 7m para edificações do tipo de uso do Atacadão, e esse uso tem absoluta relevância pelo grande impacto que, caso implantado, geraria na infraestrutura urbana devido o intenso fluxo de veículos automotores, inclusive de grande porte. Contrariando o que afirma o documento, a foto da pág. 12 evidencia incontestavelmente que, não apenas as fachadas, mas, toda a volumetria do Atacadão se destaca desarmoniosamente e agride a paisagem local, independente da cor das superfícies;
- No parágrafo da pág. 13, que começa com os termos "A convicção do
GATI acerca do gabarito...", decorre de uma percepção errada da situação,
uma vez que o limite do entorno do Centro Histórico não é a av. Almirante
Tamandaré, mas, a rua Cesário Alvim, o que indica que o empreendimento está
inserido no polígono do entorno do Centro Histórico, conforme Anexos II e VI da
Lei 7.709/1994. Portanto, o gabarito ilegalmente extrapolado causa
significativo impacto negativo à ambiência do Centro Histórico e seu entorno;
- Na pág. 14, diferente do que menciona o documento, a extrapolação do
gabarito pelo Atacadão é uma ilegalidade que nunca pode ser tolerada, e assim,
no presente caso, deve inviabilizar o empreendimento. Por outro lado, não fica
esclarecido se foi cumprida a exigência do índice de permeabilidade. Cabe
salientar que não é possível uma solução das pendências de mobilidade urbana,
uma vez que as operações de carga e descarga implicariam, necessariamente, no
trânsito de veículos automotores de grande porte, que causariam progressivos
danos na estrutura e nos revestimentos de edificações antigas localizadas em
algumas das vias de acesso ao Atacadão, e também na infraestrutura urbana. A
impossibilidade de solução desses problemas, portanto, deve inviabilizar o
empreendimento, como bem menciona o próprio documento ("... caso não fossem
cumpridos, teriam impactos negativos, que poderiam inviabilizar a implantação
do empreendimento...");
- No parágrafo iniciado na pág. 14 e continuado na pág. 15, com a
redação começando "Citando um artigo publicado pelo Ministério Público de
Goiás...", pergunto, o que leva a crer que o referido artigo deva ser
tomado como um parâmetro rígido a ser seguido em todos os casos em que seja
avaliada a necessidade de convocação de audiência pública?
- Na pág. 17, o parágrado que se inicia "Considerando que o
empreendimento está implantado...", o documento reconhece que as
"obras foram executadas em desacordo com o projeto...", parece muito
incoerente que essa instituição pública firme um TAC consolidando uma situação
de flagrante e evidente ILEGALIDADE, o que contrariaria sua incumbência,
porquanto, segundo o art. 127 da Constituição da República Federativa do
Brasil, e o art. 178 da Constituição do Estado do Pará, cabe ao Ministério
Público "a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis..."; a instituição é a
"grande fiscal do cumprimento das leis...";
- Na pág. 18, no parágrafo que assim começa "Considerando a análise
dos aspectos técnicos...", a despeito da equivocada constatação mencionada
no documento, a extrapolação do limite de gabarito previsto legalmente para
aquela área, configura significativo e inaceitável impacto negativo na
ambiência;
- Ainda na pág. 18, é subjetiva e inconsistente a afirmativa de que
"a demolição do empreendimento proporcionaria mais danos do que
benefícios", uma vez que não foi apresentado um estudo especificando os
custos e ganhos de cada uma das opções. Quanto às "expectativas de geração
de emprego e renda", e a demanda de consumo da população, poderiam ser
alcançadas tendo o empreendimento sido instalado em outra área próxima, mas,
permitida pela legislação urbanística. Nossa sociedade não pode mais tolerar a
consolidação de uma situação ILEGAL, baseada no argumento de que gerará
empregos e renda. É um precedente perigoso e ameaçador para a sociedade;
Ademais, a situação proposta pelo TAC favorece apenas os empreendedores,
visto que, se de fato consolidado o negócio, aufeririam lucros advindos de uma
atividade exercida em edificação instalada em total desobediência à legislação
urbanística, o que contraria a incumbência do MPPA de "defesa da ordem
jurídica".
Então, não se pode descartar a demolição total da edificação, que seria
a melhor alternativa para essa situação ilegal e abusiva.
- Na pág. 21, não parece uma decisão racional e justa, liberar a continuidade da construção desse empreendimento, com pendências e inconsistências identificadas no próprio documento do MPPA. Ademais, diferente do que afirma o documento, o fato da edificação ter sido erguida com o gabarito muito acima do limite permitido (quase o dobro), indubitavelmente contraria as finalidades urbanísticas e vulnerabiliza a proteção outorgada pela lei 7.709/1994.
Belém (PA), 22.12 2020.
Pedro Paulo dos Santos
Turismólogo, arquiteto e urbanista.
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Entre os cidadãos comuns, também tem aqueles em condições de opinar a respeito dos problemas da cidade... como determinam as leis.
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