NO TEMPO DO MEU PAI, nos anos 40/50... a festa acabava depois de quinze dias da procissão do Cirio.
Falo da animação que Felix Rocque promovia na Quinzena Nazarena, dos anos 40/50 do século XX. Ele trazia artistas de todo tipo e para todos os gostos e distribuía pelos teatros que abria nos quatros cantos do Largo de Nazaré.
Largo de Nazaré
Anos depois dessas fotos, no período do Cirio, o Largo de Nazaré se enchia de barraquinhas vendendo nossas comidas típicas. Essas barracas eram dirigidas pelas famílias ricas da cidade e se misturavam com os brinquedos - cavalinhos, roda gigante, sputnik, etc- que ficavam no centro do largo.
Do lado da igreja de Nazaré tinha a Barraca da Santa, que mudava de dono diariamente. As familias ricas que não tinham ficado com uma das barracas do Largo, se revesavam durante os quinze dias naquela maior. Todos os responsáveis pelas barracas faziam convite as familias amigas, as quais, primeiro iam ao teatro (um deles) e após dar uma volta no Largo, jantavam numa das citadas barraquinhas, incluindo a chamada "barraca da santa", aquela do lado da igreja. Depois, os homens podiam, inclusive, ir provocar a sorte no Casino que ficava no Grande Hotel... também dirigido pelo meu pai.
Com todos os teatros que meu pai conseguia abrir nesse período de festas, programas diferentes para sair de casa e ir ao Largo jantar, tinha a vontade. Saindo do teatro a volta que davam no Largo, não era somente para saudar os amigos que estavam nas barracas, mas também para mostrar as roupas novas... Nessa época tinha quem fazia o enxoval do Cirio, de modo que não tivesse que repetir seus vestidos durante a quinzena. Lógico que isso era para uma determinada classe.
Meu pai morreu em 1958. Meu irmão Carlos Rocque ainda tentou, por uns dois anos, levar em frente essa atividade, mas preferiu continuar a ser jornalista e escritor, assim essa usança acabou.
Hoje, a semana que antecede a procissão é plena de atividades culturais. Se somam aos lançamentos de livros, peças teatrais, o Auto do Círio e o Arraial do Pavulagem. Estes dois últimos eventos que acontecem sexta a noite e sábado depois da Romaria Fluvial -criada por Carlos Rocque - e chamam uma quantidade enorme de pessoas para a Cidade Velha e entorno. Infelizmente, sem respeitar o Código de Postura, assim a poluição corre solta.
Infelizmente esse frenesi é ajudado por instituições várias, inclusive por estabelecimentos de ensino, que acabam esquecendo totalmente a defesa do nosso patrimônio.
...e agora vamos falar dos problemas que geram, hoje.
Estamos falando de área tombada, onde se encontra a maior parte das igrejas mais antigas de Belém as quais deveriam ser salvaguardadas, protegidas, preservadas, conservadas, defendidas... Em vez, durante o ano, temos uma media de cerca de cinco casamentos por semana nessas igrejas durante os quais, até pouco tempo, era de moda usar fogos de artificio como no Cirio, na hora que os noivos saiam da igreja ... Por um período de uns 3 anos isso parou, mas na Sé, ultimamente voltaram a abusar com fogos depois das 22h. Façam as contas para ver quantas noites de poluição sonora essa área tem que suportar, apesar da legislação em vigor a respeito disso...
Nessa área tombada também acontece o carnaval, a partir do dia primeiro de janeiro de cada ano e que depois da introdução de trios elétricos e abadás, a coisa só piorou. Vamos fazer as contas, novamente, de quantos dias o patrimônio sofre a agressão da poluição sonora, sem nenhum controle sério.
Para terem uma ideia, temos também as festas dos Santos, e não somente a quadra junina, mas todas as outras e o Círio também. Muitas vezes os fogos começam as seis da manhã, e os dos casamentos, até depois das 22h, além do tambores que ousam tocar até as duas da manhã. Vamos somar a quantidade de dias que o patrimônio histórico sofre esses abusos, alguns causados por aqueles que dizem defender nossa cultura.
Na Cidade Velha, o foguetório acontece, também em todos os órgãos onde a N. Sra. de Nazaré vem em visita. E, no meio de tanta gente culta que a recebe, ninguém pensa no dano que estão fazendo ao Patrimônio Histórico?...ao menos. Quanta incivilidade, né?
Temos, também, as manifestações não somente político-partidárias na frente da Assembleia Legislativa. Além dos pronunciamentos em alto volume, temos também musica e fogos bem barulhentos que conseguem até derrubar os estuques do Museu do Estado -MEP, além de não dar sossego aos anciães que vivem no entorno. A legislação existente é totalmente ignorada. Quanta incivilidade, né?
No meio tempo, a prefeitura autoriza abusos incríveis na área tombada pelo Iphan, permitindo festas, inclusive de aniversário (até as 2h da manhã) e festivais, autodeclarados de "cultura". As associações de moradores do bairro, são totalmente ignoradas, inclusive por quem se arroga o direito de propor projetos financiador por leis culturais onde até o Código de Postura e os decibeis do CONAMA são totalmente esquecidos..... e aumenta mais a inciviidade e a prepotência.
Aliás, o mau exemplo de esquecer o art. 216.V;1, da Constituição, onde é previsto "a colaboração da comunidade" e a Lei Orgânica do Município que estabelece o "estimulo à participação da comunidade através de suas organizações representativas" ...começa nos órgãos municipais que, como se constata, não os aplica.
IGNORAM, JUNTAMENTE COM OS OUTROS FINANCIADORES, OS DANOS QUE, NÃO SOMENTE A POLUIÇÃO SONORA CAUSA AO NOSSO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E AS PESSOAS, MAS TAMBÉM A DESEDUCAÇÃO DA CIDADANIA, ao não aplicarem as leis em vigor.
Um balanço desses danos, ninguém faz... nem dos pássaros, cães, gatos e outros animais que se unem aos humanos que sofrem essa agressão sonora juntamente com os prédios tombados.
O desconhecimento do sentido de palavras quais; salvaguarda, defesa, proteção e do termo Forum, levam a pensar em má fé, em esperteza, astúcia, malandragem, ou será só superficialidade, mesmo, ao ignorá-los? Mas, um ou outro motivo que seja, danos, vão causando no meio tampo.
Tem razão Otto Lara Rezende quando diz: De tanto ver, a gente banaliza o olhar - vê... não vendo. ... o que acontece ao patrimônio durante o ano inteiro.
PS: A LEGISLAÇÃO COMPLETA A RESPEITO DA POLUIÇAO SONORA é: no âmbito Federal: Art. 225. Da Constituição Federal, Lei n. 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, o Decreto n. 99.274/90, que regulamenta a Lei n. 6.938/81, a Resolução do CONAMA n. 01, que estabelece critérios e padrões para emissão de ruídos em decorrências de quaisquer atividades industriais, Resolução n. 02, que instituição o Programa Nacional de Educação e Controle de Poluição Sonora-Silencio, e as Normas Técnicas de na. 10.151 E 10.152 da Associação Brasileira de Normas Técnicas -ABNT
PS2 :- https://civviva-cidadevelha-cidadeviva.blogspot.com/2017/09/as-mudancas-no-cirio.html
PS 3 LABORATORIO DE DEMOCRACIA URBANA “Cidade Velha-Cidade Viva”: A SEMANA DO CIRIO..
Dulce Rosa de Bacelar Rocque (uma "cabana" que mora no pedaço...).
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