Agradecemos a disponibilidade e apreciamos a seriedade.
Este o conteudo:
Ilma Sra. DULCE ROSA DE BACELAR ROCQUE
MD Presidente da Associação Cidade Velha-Cidade Viva (CiVViva)
ASSUNTO: Análise das respostas da FUMBEL e IPHAN aos
questionamentos realizados pela CiVViva quanto à instalação do Shopping Bechara
Mattar Diamont, conforme documentos anexos.
Senhora
Presidente,
Em atendimento à
sua solicitação e considerando os documentos enviados à este Conselho,
realizamos a análise à luz da Legislação Federal e Municipal vigentes.
Considerando
também o material de divulgação do referido projeto, para análise de sua
inserção na paisagem urbana, destacamos os seguintes pontos, os quais requerem os
devidos esclarecimentos por quem de direito:
1)
Quanto ao conteúdo do documento de resposta elaborado pela FUMBEL
destacamos os seguintes pontos:
a.
Trata-se de intervenção em três
imóveis diferentes, um deles atualmente sem edificação, os demais se encontram
edificados, sendo que um deles contém uma edificação estilo eclético em dois
pavimentos e o outro contém uma edificação mais recente, sem valor histórico,
em cinco pavimentos;
b.
Segundo a Lei nº 7.709/94, um
dos imóveis está classificado como bem de RENOVAÇÃO e o outro como bem de
RECONSTITUIÇÃO ARQUITETÔNICA;
c.
Os referidos imóveis estão
contíguos, porém não houve parcelamento, tampouco remembramento de lotes e a altura é permitida, já que o prédio
apresentava-se com essa altura antes da promulgação da Lei nº 7.709/94;
d.
A configuração morfológica que
hoje se apresenta foi conservada e o volume e a escala não diferem em nada do
que hoje se apresenta;
e.
Conforme a Lei nº 7.709/94, bem
de RENOVAÇÃO, é uma categoria dada a imóveis desprovidos de valores históricos.
Podendo ser demolido ou, em caso de
projeto de reforma, aproveitado a estrutura existente que deverá receber um
tratamento que o reinsira harmonicamente no contexto urbano ao qual
pertence.
f.
O projeto apresentado respeita
as regras de novas inserções em áreas históricas, entretanto estas regras são
colocadas como “um julgamento subjetivo”;
g.
O empreendimento não tem o programa de necessidades de um
shopping center (cinemas, lojas, praça de alimentação), nem poderia pela
sua dimensão. Propõe, inclusive, o mesmo uso de outrora, com exceção,
obviamente, da comercialização de fogos de artifícios: uma única loja e
sobreloja onde funcionaria o tradicional Bechara Mattar; três lâminas para
aluguel; e ao lado, salão de lazer e praça
suspensa, ou seja, uso compatível ao
permitido para o Cento Histórico. Quanto ao outro imóvel classificado como
de Reconstituição Arquitetônica foi proposto o uso de pousada;
h.
As atividades propostas, uso de
comércio varejista e serviço, inserem-se em modelos urbanísticos permitidos para a área;
i.
O empreendimento não necessita de EIV[1],
por não se tratar de shopping center. A Lei de Estudo de Impacto de Vizinhança ainda não foi regulamentada, não existindo
parâmetros para sua aplicabilidade e “o projeto não trará prejuízos ambientais
ou urbanísticos”;
j.
Apesar da não obrigatoriedade
de estacionamento, o projeto prevê 12 vagas, número compatível ao tipo de
empreendimento;
k.
O empreendimento não terá maiores
impactos que outros que já funcionam no Centro Histórico de Belém;
l.
O projeto está caracterizado como Reforma com Acréscimo de área, entenda-se que o acréscimo
considerado não se deu por colocação de cobertura, e sim em áreas livres
existentes no lote e esse acréscimo também apresenta conformidade com os
índices urbanísticos previstos na Lei Municipal nº 7.709 de 18/05/94.
ANÁLISE:
Os presentes questionamentos
foram embasados na análise comparativa entre os itens anteriormente destacados,
as imagens de divulgação do projeto e as imagens da situação atual dos imóveis,
estas capturadas a partir do recurso Street View do Google Maps, constantes no
ANEXO I deste perecer. Observamos, portanto, que:
Apesar da
afirmativa realizada no item “d” do documento enviado pela FUMBEL, observamos
na comparação das imagens (Anexo I) que a condição atual do imóvel de esquina já
gera uma grande interferência na escala e configuração da paisagem, pois o
volume se destaca pelas suas proporções e escala vertical, gerando contraste
com a escala das edificações existentes em seu entorno imediato. Além disso,
percebe-se claramente a adição de mais um pavimento ao volume existente, com
paredes e cobertura translúcidas, o qual aumenta, portanto, a interferência
visual já existente. Tal constatação também contradiz a afirmativa colocada no
item “c”, já que houve acréscimo em relação à altura anterior da edificação.
Esta condição é
agravada, quando observamos a relação entre aberturas e vedações (cheios e
vazios) da fachada do prédio de esquina, na qual percebemos claramente que a
escala e o ritmo da composição do conjunto de fachadas foi rompida, já que a
solução arquitetônica não levou em consideração a inserção da fachada no
conjunto edificado. Tal observação contradiz também as afirmativas dos itens
“e” e “f”.
Ainda no item
“e” o documento da FUMBEL afirma que o bem é de RENOVAÇÃO e que, como o projeto
se constitui em REFORMA, deverá haver o aproveitamento da estrutura existente,
a qual deveria ter um tratamento que a reinserisse no contexto urbano, fato que
não ocorreu, considerando os comentários do parágrafo anterior. Entretanto, no
item “l” a FUMBEL afirma que o projeto apresenta acréscimo de área, referente à
ocupação de áreas livres existentes no lote. Hora, sabido que houve também
acréscimo de mais um pavimento, cabe então a seguinte questão: “Considerando
que a edificação, na forma como se apresenta hoje, representa uma desconformidade
com a legislação que rege os parâmetros de controle urbanístico, vigentes na
área, e afeta a configuração da paisagem tombada, é lícito permitir sua
ampliação, visto que esta significa a “ampliação de uma desconformidade”? E
ainda: Como permitir que esta ampliação ocorra ferindo ainda mais os parâmetros
legais estabelecidos?
Verifica-se
também, na análise constante no Anexo I, que além da adição de um pavimento a
mais, houve a construção de um volume anexo, pela Av. Pe. Champagnat, o qual
possui três pavimentos (nove metros de altura, se considerarmos a altura padrão
de três metros por andar – ver Anexos I e II), conflitando com o disposto na
Lei 7.709/94, a qual estabelece o gabarito de sete metros para a área. Como
esta “ampliação” se constitui em uma nova edificação, esta deveria respeitar os
parâmetros da legislação atual. Entretanto, no item “h” a FUMBEL afirma que as
atividades propostas inserem-se em modelos urbanísticos permitidos para a área.
No item “i e k”
a FUMBEL afirma que o Bechara Mattar Diamond não se trata de um shopping center e, portanto, não necessita de
EIV, acrescentando que o empreendimento não terá impactos e que o instrumento não pode ser aplicado por não estar
regulamentado no Município de Belém. Entretanto, na propaganda de
divulgação do empreendimento, lançada no jornal O Diário do Pará, os
proprietários dizem o seguinte:
“O Bechara
Mattar Diamond é um Shopping de Charme. Trata-se de um complexo comercial de
LUXO, com áreas exclusivamente para locação. O BECHARA MATTAR DIAMOND terá
cinco mil metros quadrados de área construída com áreas comercias, empresariais,
restaurante panorâmico na cobertura
com vista privilegiada da Baía do Guajará, praça
suspensa, elevador panorâmico na área exclusiva de embarque e desembarque, espaços
para eventos, casamentos, aniversários cursos, exposições shows, etc” (fonte: Diário do
Pará - Caderno Negócios).
Visto que o EIV
é um instrumento de Gestão Democrática, que visa a promoção de uma série de
discussões para que a população, especialmente os moradores locais, se aproprie
do projeto e conheça os impactos negativos e positivos, bem como as ações
previstas para a compensação ou mitigação dos impactos, não entendemos o porquê
da FUMBEL afirmar que sua aplicação não é necessária, visto que os próprios
empresários responsáveis pelo empreendimento o consideram como um Shopping
Center.
Por outro lado,
o Art. 187 da Lei 8.655/2008 (Plano Diretor) diz que a atividade Shopping
Center é considerada empreendimento de impacto independente da área construída e, no ART. 188 consta que sua aprovação está condicionada à
realização de Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança, portanto, a alegação
de que o instrumento não está regulamentado não viabiliza sua aprovação, pois,
a exemplo da SEMMA, que elaborou um termo de Referencia para a cobrança de
EIV/RIV no licenciamento ambiental, e da SEMOB, que elaborou uma instrução
normativa para a cobrança de EIV/RIV no caso de atividades geradoras de impacto
no tráfego, a SEURB e FUMBEL já deveriam ter tomado procedimentos para a
aplicação do EIV, mesmo sem sua regulamentação.
No caso deste
empreendimento a exigência de EIV torna-se pertinente não só pela atividade
Shopping Center, mas também pelo fato de ser um projeto que claramente poderá
causar impacto na paisagem urbana e no patrimônio cultural, conforme
discriminado no Art. 188, inciso VII, do mesmo Plano Diretor.
2)
Quanto ao parecer anexo elaborado pelo IPHAN (Parecer nº 025/2010 –
IPHAN/PA) destacamos os seguintes pontos:
a.
Os imóveis em questão estão
inseridos em área de entorno de monumento tombado pelo Governo Federal:
Conjunto Arquitetônico e Paisagístico da Praça Frei Caetano Brandão e Conjunto
Arquitetônico e Paisagístico do Ver-o-peso;
b.
Encontra-se também em área
delimitada e tombada pelo Município de Belém, denominada Centro Histórico de
Belém;
c.
Quanto ao imóvel de esquina
(Rua Pe Champagart, nº 53): Trata-se de reforma com adaptações e construção de
um anexo, em terreno posterior não edificado, para a instalação de novo uso. O
imóvel tem características de arquitetura contemporânea, com cinco pavimentos,
classificado como bem de RENOVAÇÃO ARQUITETÔNICA;
d.
Quanto ao imóvel contíguo
localizado na Rua Tomázia Perdigão, nº 30: Trata-se de adaptação da estrutura
existente que abriga um comércio, para um hotel de pequeno porte, contendo seis
apartamentos. Possui dois pavimentos e é coroado por platibandas, com
características ecléticas e encontra-se parcialmente descaracterizado (ver Anexos
I e II);
e.
O projeto protocolado para análise
correspondente ao imóvel da Rua Pe Champagart, nº 53, é constituído de
pavimento térreo, mais cinco pavimentos, apresentado em oito pranchas, mais a
maquete eletrônica;
f.
O projeto referente ao imóvel
da Rua Tomázia Perdigão, nº 30, possui dois pavimentos, apresentado em sete
pranchas;
g.
No projeto correspondente ao
imóvel da Rua Pe Champagart, nº 53, o
parecer afirma que: “A composição formal proposta dialoga com as edificações
pretéritas e apresenta parâmetros associados ao ritmo criado pela relação de cheios
e vazios e também com relação à volumetria”;
h.
No projeto correspondente ao
imóvel da Rua Tomázia Perdigão, nº 30, o parecer afirma que: “será feita a
recuperação arquitetônica das características externas do imóvel, que abrigará
um hotel........Os elementos perdidos da fachada principal serão reconstituídos
e seus elementos arquitetônicos remanescentes serão restaurados”;
i.
Quanto ao imóvel da Rua Tomázia
Perdigão, nº 30 o IPHAN não se opõe acerca das intervenções pretendidas
afirmando que: “... o projeto apresentado preserva
e recupera suas características pretéritas”;
j.
Quanto ao imóvel da Rua Pe
Champagart, nº 53 o IPHAN também não se opõe acerca das intervenções pretendidas, afirmando no
parecer que: “... as modificações previstas para sua volumetria externa
(ampliação de área) não irão causar
interferências na visibilidade e na ambiência dos Bens Tombados localizados no
entorno próximo;
k.
O parecer do IPHAN data de 24 de janeiro de 2011 e possui prazo de
validade de um ano para a execução do projeto solicitado.
ANÁLISE:
Considerando a
análise anterior e também a análise comparativa entre os itens destacados do
perecer nº 025/2010 – IPHAN/PA, as
imagens de divulgação do projeto e as imagens da situação atual dos imóveis,
estas capturadas a partir do recurso Street View do Google Maps, constantes no Anexo
I. Observamos, portanto, que:
No parecer do
IPHAN não apresenta elementos que contradigam a análise realizada a partir da
Resposta da FUMBEL à CiVViva, entretanto nos causa estranheza as afirmações
constantes nos itens “g” e “j”, referentes ao imóvel situado na Rua Pe
Champagart, nº 53, pois análise comparativa constante no Anexo I deste
parecer, comprova que as afirmativas realizadas conflitam com o projeto
divulgado na mídia pelos proprietários.
Considerando
os itens apontados na análise do Anexo I e todas as argumentações colocadas na
análise das respostas da FUMBEL, comparativamente à conclusão do parecer do
IPHAN nos incita a seguinte dúvida: Será
que o projeto protocolado no IPHAN a três anos atrás (o parecer é de 2011) é o
mesmo que foi divulgado recentemente.
CONCLUSÃO:
Conforme o
exposto fica evidente na análise realizada, que há muitos itens a serem
esclarecidos à sociedade sobre o PROJETO em questão e sobre seu PROCESSO DE
APROVAÇÃO, tornando pertinente, portanto, todas as dúvidas e receios da
sociedade e, especialmente dos moradores do bairro da Cidade Velha, os quais
encontram-se extremamente preocupados com os impactos a serem causados na vida
do bairro e em seu patrimônio histórico.
Desta forma,
concluímos que o instrumento mais adequado para dirimir quaisquer dúvidas e
garantir à sociedade o conhecimento e os esclarecimentos a que esta tem direito
sobre o projeto, seus possíveis impactos e as ações necessárias para mitiga-los
ou compensá-los é a elaboração e discussão do EIV/RIV, garantindo a realização
de audiências públicas e o acesso aos processos de aprovação do mesmo nos
órgãos competentes.
Este é o Parecer.
ALICE DA SILVA RODRIGUES ROSAS
Arq.
e Urb., Conselheira do CAU/PA
[1] EIV – Estudo Prévio de Impacto de Vizinhança, instrumento de gestão
democrática constante no Estatuto da Cidade (lei 10.257/2001).
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