quinta-feira, 15 de maio de 2014

Manisfesto Cidade Velha 400 anos

MANIFESTO CIDADE VELHA - 400 ANOS

A Cidade  Velha, como testemunha da nossa história, deve,  através de seus prédios, nos lembrar o  passado.   Ultimamente, porém,  o que está acontecendo com nosso patrimônio arquitetônico nos leva a reconhecer que  nossas casas, mais que  testemunhas do tempo estão se transformando em vitimas dos homens.

À medida que passam os anos, mais aumenta o degrado e a descaracterização do patrimônio histórico arquitetônico da cidade de Belém.  A total ausência de uma política permanente de valorização da nossa memória histórica, da nossa identidade cultural, se torna evidente com a visão de abandono de imóveis históricos e com a constante demolição de casas antigas, muitas delas sendo substituídas por estacionamentos, sem que se vejam ações que levem a intimidar tal comportamento.

Belém resultava possuir cerca de 7 mil imóveis e conjuntos urbanos localizados no seu centro histórico e entorno, no entanto,  estamos perdendo essa nossa identidade cultural para estacionamentos e espigões construídos desordenadamente, muitas vezes a causa de falta de regulamentação de leis, de aplicação de modo correto das mesmas, ou por absoluta falta de fiscalização, tornando cada vez mais simplória e vulgar a paisagem urbana de nossa Belém.
Vemos também se desenvolver relações praticamente cenográficas ou cinematográficas entre os arquitetos e a nossa área histórica. Essa é a lamentável sequela de um processo mais emparentado com a arte efêmera  do que com a arquitetura que temos que salvaguardar, segundo as leis em vigor.  Tudo isso feito sem lembrar os problemas do entorno.

Visto o estado de baixa ou total ausência de autoestima e de noções básicas de cidadania  em que nos encontramos, seria necessário  e oportuno que os três níveis de governo iniciassem campanhas educativas maciças  e permanentesa fim de modificar essa realidade, pois exemplos isolados e raros de educação patrimonial não estão dando resultados.
Por outro lado, achamos ser necessário e oportuno, também, enfrentar essa situação com a proposição de um Plano de Valorização do Patrimônio, partindo de uma Estratégia de Reabilitação do Centro Histórico, ou ao menos da Área tombada, que leve em consideração todos os imóveis representantes das várias  fases da nossa história, e, não somente, daqueles, poucos, de propriedade pública.
Aliás, conforme determina o Estatuto das Cidades e o Plano Diretor do Município de Belém (art. 21, XI),  seria o caso de iniciar o processo de elaboração e implementação do Plano de Reabilitação e Conservação  de Áreas do Centro Histórico e seu entorno, com ampla participação, também, da sociedade civil.
Tais atos devem enfrentar, por exemplo, a dificuldade de acesso ao financiamento por parte de particulares; os conflitos entre proprietários; os problemas dos herdeiros de tais imóveis; a identificação dos proprietários de imóveis desocupados e/ou abandonados; a questão da falta de pagamento do IPTU, etc.
A ‘propriedade’ de um imóvel é, hoje, o ponto fundamental de atrito relativamente à falta de conservação do nosso patrimônio arquitetônico e, consequentemente, da impossibilidade de acesso aos financiamentos. Se sabemos disso, seria oportuno começar a pensar num modo de resolver essa dificuldade. Isso é prioritário dentro de uma política séria de defesa do nosso patrimônio. Penalidades como a perda do bem (se abandonado), devem ser pensadas, passando ao Estado o direito de restaurar e dar o destino  que bem prouver para o povo. Sabemos que são necessárias creches, escolas, pronto socorro, UPAS etc... assim já seria uma grande conquista,  sem ter que desapropriar, indenizar etc....
A valorização e defesa da nossa Memória Histórica depende de um Plano que pense, além da reabilitação do Centro Histórico, a dos equipamentos municipais, do espaço público da área tombada, também no patrimônio disperso pela cidade. Nele precisa ser reconhecida a necessidade de conservação periódica, a redução de riscos de incêndios, ao menos nos imóveis em que tenham sido feitas intervenções, restauro etc., e para isso a distância dos postes de iluminação elétrica, são exemplos fundamentais de necessidade de atenção nas áreas tombadas.
Numa cidade considerada “Histórica”, como Belém, é necessário saber quantos e quais imóveis precisam, devem e podem ser reabilitados até 2016, para seus 400 anos, e naqueles a seguir, quem sabe até  pelos próximos 20 anos  Quais são prioritários: não somente alguns públicos, mas os privados, também, principalmente aqueles que já estão em risco de ruína. Precisa que sejam avaliadas as necessidades dos habitantes, dos moradores, de quem paga o IPTU na área em questão, e não dar peso apenas à criação de cenários que nada têm a ver com a defesa de nossa memoria histórica, ou dar peso às necessidades de possíveis turistas, que não aparecem.
Fundamental é que essa Estratégia vise defender nossa história, salvaguardando-a,  ao invés de  incentivar a criação de algo que nada tem a ver com nosso passado, ou criar falsos históricos dentro da área tombada. Se isso é possível para os imóveis públicos, deve ser possível também para os particulares.
Esquecer o problema do excesso de trânsito, que, com a trepidação que provoca nos imóveis, por certo, ao contrário, não ajuda na defesa do nosso patrimônio, é inadmissível.  Como prever a restruturação de imóveis situados em ruas com excessos de movimento de caminhões, carretas, ônibus e vans, além dos veículos dos moradores, sem se preocupar em eliminar a trepidação provocada por eles?
É necessário lembrar que, determinados usos de prédios em área tombada, afetam diretamente a vizinhança e repercutem no entorno,  acabando por atingir, direta ou indiretamente toda a coletividade. O tráfego viário, a falta de estacionamento, a poluição sonora e atmosférica são determinados pelas características de uso das edificações do bairro. Tais usos geram direitos para os vizinhos que podem até querer  impedir que o uso nocivo da propriedade alheia lhes afete.
Notamos que o cidadão e seus problemas são totalmente ignorados em momentos de decisões relativas a ações no Centro Histórico. De fato, para a Cidade Velha de Belém, precisam ser lembrados problemas que o cidadão residente tem, tais como:
- Segurança. O que é em programa para contrastar esse aumento da “sensação”, concretíssima, de insegurança nas áreas tombadas (ou não)? Ao menos câmaras deviam ser colocadas nas ruas, vista a indisponibilidade de Guardas Civis ou Policias Militares em quantidade adequada para tais serviços;
- Calçadas, normalmente estreitas, que são ocupadas com postes que, além de serem praticamente grudados nas casas, impedem o uso das mesmas pelos pedestres, obrigando-os a andar pelo meio da rua;
- Os incêndios, que ocorrem cada vez mais frequentemente em tais postes, são um perigo enorme para as construções do entorno;
- A ocupação das calçadas por carros estacionados nas pedras de liós (tombadas), também obriga o pedestres a usar o leito da rua, não a calçada;
- Os bares e restaurantes que tem (ou não) autorização a colocarem suas mesas e cadeiras nas calçadas, também expulsam o pedestre para o meio da rua;
- A nivelação das calçadas é um problema ignorado por todos e obriga, novamente, quem usa cadeira de rodas ou tem outros impedimentos físicos, a andar pelo meio da rua;
- O aumento da frota de carros particulares, após a diminuição do IPI, não foi acompanhado por um aumento de garagens e estacionamentos, resultando em que, as calçadas mudaram definitivamente de uso e, mais uma vez, o cidadão, como os cavalos, antigamente, deve usar o leito da rua;
- O aumento do trânsito de vans, a maior parte velhas e  pouco respeitosas do Código do Trânsito, é um enorme perigo para aqueles transeuntes que não podem usar a calçada, porque ficam ocupadas por carros, ali estacionados, ou incomodam, pelo desníveis das mesmas, principalmente os idosos, que, em geral, são portadores de dificuldades para locomoção;
- O aumento da poluição sonora, não somente por parte de locais de divertimento que têm pouco respeito, dada a altura da música nos seus interiores, mas também  de carros que buzinam na porta das escolas, em que pais e/ou responsáveis chamam  os filhos, e daqueles que, principalmente de noite, andam com o bagageiro aberto, com música em volume altíssimo;
-  a absoluta falta de fiscalização nos locais noturnos que, além de não respeitarem os horários de    inicio e encerramento da atividade, não possuem estacionamentos para os clientes;
- A água, que sai marrom das torneiras, obrigou, ao longo dos anos, a abertura de poços artesianos nas casas do bairro..., ninguem reclamou e a água continua saindo marrom das torneiras;
- A construção de mastros de estações de telecomunicação aumentou sem que nenhuma providência fosse tomada a respeito, apesar das denuncias feitas;
- O aumento das pichações dos imóveis, principalmente daqueles recuperados recentemente, é demonstração de pouca vigilância pública, até mesmo com câmaras;
- E as ruas da orla do bairro da Cidade Velha fechadas ao público, ao uso dos cidadãos, de forma abusiva, por que é ignorada?
Enfim, até cursos de educação cívica notamos que são necessários.
Esse modo de olhar a cidade, do ponto de vista de uma melhor vivência do cidadão que mora no Centro Histórico, nós não percebemos  há anos. A preocupação para com os turistas não deve ser superior aquela com quem mora em tais áreas; não se deve esquecer de quem paga o IPTU e vota regularmente. O problema das calçadas, da água, dos postes, dos estacionamentos, de garagens, de iluminação das ruas, de mobilidade e da segurança de quem ali vive, não deve ser pouco considerada, ou até mesmo tão ignorada, pensando só em embelezamentos para atrair turistas.
O que queremos ressaltar, com este Manifesto, é a necessidade que sentimos de pensar na defesa da nossa memória histórica, não com ações ocasionais e superficiais ou simplesmente visando atrair turistas, mas com propostas que tenham presente a defesa dos vários ângulos da vida no centro histórico, sem esquecer quem o habita. Propostas que nasçam de estudos da realidade de tais áreas e não somente pensando na aparência de alguns prédios ou em turistas que não vemos aparecer.
A Cidade Velha e Belém vão fazer 400 anos em 2016, gostaríamos que essa nossa terra morena e brejeira pudesse abraçar a todos os moradores, vizinhos e turistas, sem tantos problemas e com muito mais autoestima.

A direção da  CiVViva

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